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Uma vez li uma matéria
sobre a banda que dizia: "em um mundo melhor, os
Afghan Whigs seriam rock stars". Numa outra, no
entanto, o texto era diferente: "É incrível como
uma banda como o Afghan Whigs pode existir". São
as contradições que fazem desta banda algo tão interessante,
além de seu som rico e a interpretação do vocalista
Greg Dulli. |
A banda chegou a
chamar a atenção com o disco Gentlemen, de 93, após
os excelentes (e talvez até mesmo grunges) Up In It e Congregation.
Black Love (96), porém, confundiu os fãs, a crítica e dividiu
as opiniões. Desde já, posso afirmar: este disco é o melhor
da banda, mistura todas as fórmulas que os fizeram um dos
melhores grupos dos anos 90.
As influências de motown e soul estão presentes, unidas ao
rock explosivo e emocionante e já característico da banda.
Talvez seja um álbum difícil de se compreender logo de primeira
devido a todas estas influências, mas com certeza a cada vez
que for ouvido um novo elemento será acrescentado.
O disco, como você irá perceber quando a última faixa se esgotar,
conta uma espécie de história (isto mostra o interesse de
Greg Dulli pelos filmes), que tem início com "Crime scene
part one". Aliás, não haveria maneira melhor de começar.
A voz de Dulli consegue prender a atenção do ouvinte. Ele
canta: "Every secret has its price / this one's set to
kill", depois estoura num cativante refrão. No fim, ela
termina como começou.
Depois entra "My Enemy", uma das mais "fáceis"
do disco. Com certeza seria um sucesso radiofônico, caso a
banda tivesse a atenção que merecia. Ela continua a saga,
com uma letra interessante ("There was a voice behind
my back / his face I could not see it clear / the voice was
so familiar, though / I knew my enemy was near"), acordes
fáceis e empolgantes (se você reparar, perceberá que são os
mesmos acordes de "Milles iz ded", a última faixa
de Congregation, e de "What Jail is Like", de Gentlemen,
algo bastante comum entre as músicas da banda).
Então começa "Double Day", mantendo o excelente
nível do álbum de uma forma um tanto quanto dramática, ao
mesmo tempo que expõe o lado obssessivo de Dulli ("Later
that afternoon/ my paranoia got the best of me").
"Blame, etc" mostra uma influência bem clara
de motown e possui um refrão explosivo perfeito para a voz
de Dulli e que com certeza ficará na sua cabeça por um bom
tempo.
"Step into the Light" dá um tempo para respirar;
é uma música mais reflexiva com vocais muito bem interpretados,
afinal, uma balada bem legal para se ouvir.
No entanto, o clima de tranqüilidade termina logo nos primeiros
acordes de "Going to Town", que segue a linha retrô
de "Blame, etc" e também com um refrão muito bom:
"Go to town, burn it down, turn around / And get your
stroll on, baby / I'll get the car / You get the match / And
gasoline". É uma espécie de love song bem inteligente,
além de ter sido um dos singles do álbum.
Logo em seguida começa "Honky's Ladder", talvez
a melhor música do disco, talvez um resumo de todo ele, uma
espécie de clímax. Segundo já disseram, "uma música capaz
de fazer uma pedra dançar", além das letras sempre interessantes
("If you tell me / Don't get mixed up with the devil
/ that's exactly / What I'm gonna do").
"Night By Candlelight" é uma bela música que segue
a linha de "Step Into The Light", mais uma grande
música (Dulli canta: "Am I vain? / Have I shame? / Are
my thoughts of a man / who can call himself sane?).
Enfim, as três últimas músicas, talvez a melhor seqüência
do disco, que começa com "Bulletproof", que é levada
muito bem pela guitarra de Rick McCollum e os vocais de Dulli,
além de acompanhado por um teclado providencial, até estourar
no melhor e mais pegajoso refrão do álbum: "Every time
I dream about you baby / With your hands all over me / I never
forget anything / Don't forget that I'm asleep". No final,
uma espécie de solo de piano.
"Summer's Kiss" é outra música que segue a fórmula:
influências + vocais certos nas horas certas + letras emocionantes,
além da banda dando base para que tudo isto se evidencie.
Ela poderia fechar o álbum, uma vez que possui um certo clima
de despedida, um sentimento nostálgico, junto a letra ("Do
you know the words? / Sing along with me / And put on your
rose fur coat, baby / It's 1973").
Mas não haveria melhor maneira de se fechar este disco do
que com "Faded", com seus nove minutos que provam
definitivamento o valor da banda. Segundo Greg Dulli, sua
melhor composição até então e, embora eu não possa confirmar,
não é difícil perceber que se trata de uma música memorável.
Aquela velha fórmula continua e nunca funcionou tão bem; a
letra mostra o quanto Dulli estava inspirado: "Faded
/ This I feel / Behind the blue clouds / I remain concealed
/ Lord, lift me out from the night / Come on, look down /
And see the mess I'm in tonight". A mais emocionante
canção do disco, que ainda encerra a saga, fazendo referência
ao longínquo início desta história, na primeira faixa ("This
secret is gonna kill you / In the end"). Um épico, não
faria nada mal se fosse posta ao lado da clássica "The
End".
E assim como acontece com os grandes clássicos, simples palavras
não podem descrever a beleza deste trabalho, aliás, não tenho
qualquer pretensão de fazê-lo; basta colocar o disco para
tocar e comprovar o que foi escrito além de descobrir novas
qualidades. O tipo de álbum que não deveria ter qualquer rótulo
além de simplesmente "música". Infelizmente um disco
pouco conhecido de uma banda pouco conhecida num mundo injusto,
resta somente guardá-lo como um segredo.
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