Beck
Hansen nasceu em 8 de julho de 1970 em Los Angeles, filho
da atriz Bibbe Hansen e do músico de raiz David Campell. Com
uma família de artistas, o jovem Beck cresceu num ambiente
que incentivava o seu interesse pelas artes e claro, por música,
especialmente folk e blues.
Aos 14 anos, Beck já tocava violão e durante a adolescência
acompanhou o surgimento da cena hip hop de Los Angeles. Algum
tempo depois, Beck passa a morar com seus avós em Kansas,
onde seu avô era um pastor da igreja presbiteriana. Em seguida,
ele passa um tempo na Europa com seu outro avô, o também artista
Al Hansen. Nessa época, Beck tocava violão com influência
de blues do Mississippi, com letras improvisadas.
Beck saiu da escola aos 16 anos e depois de algum tempo, ele
resolve mudar para Nova York, já decidido a seguir na música.
Naqueles tempos, surgia no East Village em Nova York um movimento
underground chamado anti-folk, que combinava a sonoridade
folk com a estética e atitude do punk. Beck foi influenciado
e daquilo que acontecia em NY, embora não tenha se firmado
na cena. Por volta de 1990 ele estava de volta a Los Angeles.
Em Los Angeles, ele se apresenta pela primeira vez em bares
e festas. A esta altura, a música de Beck refletia todos os
estilos a que ele havia sido exposto, do folk ao blues do
delta do Mississippi, de hinos presbiterianos ao hip hop de
rua, além de punk com letras de improviso.
O
caldeirão de influências vai tomando forma enquanto
Beck seguia batalhando em empregos de segunda categoria
e morando de favor, dormindo em sofás alheios. O primeiro
fruto de sua ainda nascente carreira musical é o single
"MTV Makes Me Want to Smoke Crack" para a
gravadora independente Bong Load Custom Records. A tiragem
era limitadíssima e os objetivos, além de registrar
o seu trabalho, era puramente promocional e não comercial.
Mais alguns singles depois surge "Loser",
a música que iria mudar a carreira de Beck para sempre.
A música foi produzida pelo próprio Beck e o produtor
de hip-hop Karl Stephenson e em muito pouco tempo se
tornou popular nos circuitos alternativos de Los Angeles.
O 'perdedor' Beck e seu hit instantâneo passaram a ser
disputados em um verdadeiro leilão pelas grandes gravadoras.
A DGC para levar a melhor, precisou da intervenção direta
do fundador David Geffen, que convenceu o cantor com
um telefonema. O resultado foi o lançamento de Mellow
Gold, o álbum de estréia de Beck no início de 1994 contendo
"Loser" como principal single. |
0
|
A lenda diz
que o disco (que já estava pronto antes da DGC entrar na jogada),
custou cerca de 300 dólares. A carreira de Mellow Gold nas
paradas foi lenta mas consistente. De início, o disco era
tocado somente pelas college rádios americanas, para pouco
a pouco ganhar de vez o grande público.
O trabalho de Beck conquistou a crítica que considerava "Loser"
um hino da 'slacker generation' (ou geração da preguiça ou
relaxada, uma variação do termo "generation x", muito usado
nos anos 90, que denominava uma geração marcada pela apatia).
Numa época em que nunca se discutiu tanto as questões de comercialismo
e autenticidade, era fácil tachar Beck de cínico (ou no mínimo
sarcástico) por uma música como "Loser", já que o cara conquistou
o sucesso e fez um grande contrato com uma gravadora importante.
Mas o que pouca gente sabia é que na época em que compôs "Loser",
Beck vivia em um galpão infestado de ratos, e trabalhava numa
locadora de vídeo onde, entre outras coisas, separava as fitas
da seção de filmes pornográficos em ordem alfabética por um
salário risível. Sobre a questão slacker, o próprio Beck desmentiu
em entrevista, "Eu nunca fui slacker. Eu estive trabalhando
em empregos de 4 dólares por hora tentando permanecer vivo.
Essa coisa de slacker é para pessoas que tem tempo de ficar
deprimidas com qualquer coisa.
Ao contrário de se deter apenas no hit, o álbum "Mellow Gold"
estava ali para ser ouvido. E para quem encarou "Mellow Gold",
se deparou com uma mistura absurda de gêneros e sonoridades.
E não que o disco atirasse para todos os lados, exibindo clichês,
nada disso. Beck conseguiu orquestrar um trabalho coeso, consistente
e espontâneo, onde numa mesma música podem ser encontrados
elementos de rock, de hip-hop, psicodelia, folk e country
misturados a uma sonoridade ao mesmo tempo bem trabalhada
e rica em detalhes, porém tosca e suja, tudo a ver com o rock
alternativo de então. No início dos anos 90 onde termos como
multimídia e superestrada da informação (alguém lembra disso?)
começavam a se tornar comuns, um álbum como "Mellow Gold"
era o resumo dos novos tempos.
O contrato de Beck com a DGC previa uma regalia inédita: Beck
estava autorizado a lançar álbuns por gravadoras independentes
conforme a sua vontade. E então, "Mellow Gold" foi apenas
mais um dos três lançamentos do cantor programados para 1994.
Pela gravadora Flipside foi lançado "Steropathetic Soulmanure",
uma excêntrica e esquizofrênica coletânea de demos (gravadas
entre 1988 e 1993). E pela K Records de Olympia foi lançada
uma pequena obra, "One Foot in the Grave", que explora as
influências mais folk de Beck com uma sonoridade bem descuidada,
um álbum folk de garagem. O disco conta com a parceria de
Calvin Johnson (do lendário Beat Happening e dono da K Records)
na composição de várias músicas e dividindo os vocais em algumas
delas.
Em
1995 foi lançado o EP "A Western Harvest Field by Moonlight"
pela hoje falida Fingerpaint Records, que consiste mais
em experimentalismo puro do que propriamente canções.O
segundo disco pela Geffen saiu somente em 1996, "Odelay"
recebido imediatamente com o status de clássico. O disco
teve a produção dos Dust Brothers e conseguiu um resultado
ainda mais harmonioso e explosivo da mistura bizarra
do som do Beck. |

Repare o recadinho sutil
da jaqueta: Folk You!
|
"Odelay" as
vezes lembra colagens de diferentes referências, unindo bossa
nova (existe um sample de Desafinado de João Gilberto em uma
das faixas) com rock, country, folk, rap e o que for. O disco
trouxe muitos hits, como "Devil's Haircut", "New Pollution"
e "Where It's At", e esteve presente na maioria das listas
dos melhores de
1996, ficando em primeiro lugar em muitas delas. Surpreendentemente,
"Odelay" foi indicado ao Grammy de melhor disco do ano além
de outras indicações ao prêmio mais importante e mais cabeça-dura
da música americana.
Em 1998, Beck trabalhou com o produtor Nigel Godrich, que
havia produzido a obra-prima "Ok Computer" no ano anterior.
O resultado da parceria foi "Mutations", um disco bem menos
híbrido que os trabalhos anteriores, sendo mais reminiscente
da influência folk do Beck, assim como "One Foot In The Grave".
Só que, diferente deste último, "Mutations" trazia uma sonoridade
muito bem trabalhada, explorada ao extremo pelos requintes
da produção de Godrich e pela banda de apoio. Foi a primeira
vez que Beck entrou em estúdio com uma banda de apoio, ao
contrário do que acontecia antes, quando o cantor contava
com participações especiais e músicos contratados. O disco
era para ter sido lançado por uma gravadora independente,
mais precisamente a Bong Load, mas a Geffen achou "Mutations"
tão bom que resolveu lançá-lo. No entanto, nem a Geffen, nem
Beck consideravam "Mutations" como o sucessor de "Odelay",
sendo tratado como um trabalho paralelo sem maiores pretensões.
Como curiosidade, o título "Mutations" seria uma referência
aos Mutantes e a música "Tropicalia" uma homenagem ao movimento
de mesmo nome. Beck é fã assumido da música brasileira.
Em 1999 foi relançado pela gravadora Sonic Enemy o álbum "Golden
Feelings", que é anterior a "Mellow Gold". Lançado somente
em fita cassete, num esquema de gravação caseira, "Golden
Feelings" sequer era considerado na discografia do Beck, e
a partir de seu relançamento, as origens e as primeiras gravações
do músico puderam ser conhecidos.
No mesmo ano, surge o legítimo sucessor de "Odelay", intitulado
"Midnite Vultures". Assim como em "Mutations", também não
é um trabalho de mistura de estilos e colagens de samples
como foi "Odelay" e "Mellow Gold". Trata-se de um bem humorado
álbum de influência de soul music, Prince é a principal referência,
onde Beck canta com um alcance vocal inacreditável, recheado
de agudos e falsetes inesperados. "Midnite Vultures" não repete
o mesmo sucesso dos álbuns anteriores, embora a reação da
crítica fosse no geral bem positiva. No entanto, "Midnite
Vultures" rende uma enorme turnê mundial, que passa pelo Brasil
em 2001 durante o Rock In Rio 3.
2000
foi o ano de lançamento de "Stray Blues", uma coletânea
de 8 músicas que é uma espécie de volta ao ecletismo
e diversidade musical. O disco foi lançado apenas no
mercado japonês e até hoje é disputado a tapa pelos
fãs mais devotados.
Em 2002, Beck volta a trabalhar com Nigel Godrich e
o resultado é o espetacular "Sea Change" (Geffen). |

|
O disco é
recebido com entusiasmo pela crítica, e mostra mais uma mudança
de direção. Desta vez, as melodias são mais melancólicas e
introspectivas, com influência do folk britânico de Nick Drake
e mesmo Donovan. Os arranjos são impecáveis, misturando a
simplicidade de violões acústicos com belos arranjos de cordas
e discretos efeitos eletrônicos. Para a turnê de divulgação
de "Sea Change", Beck contou com um reforço notável, o Flaming
Lips. Além de banda de abertura, o Flaming Lips tornou-se
a banda de apoio do Beck, numa turnê que tornou-se lendária.
E então chegou o momento de retomar o Beck que o grande
público conheceu. O próximo álbum teria
a produção dos Dust Brother e isso foi o suficiente
para começarem as especulações sobre
o novo "Odelay". O lançamento de disco foi
adiado por várias vezes, até que uma versão
não finalizada do disco vazou na rede e o lançamento
de "Guero" foi marcado definitivamente para abril
de 2005. Beck havia prometido guitarras, Jack White (White
Stripes) participou de uma faixa, mas o tom do disco é
mesmo o caldeirão sonoro de "Odelay". Claro
que o impacto não foi o mesmo, "Odelay" só
existe um, mas "Guero" foi muito bem recebido por
crítica e fãs, marcando mais um bom item na
discografia do Beck.
Alexandre Luzardo
Fevereiro 2003
atulizado em abril/2005 - AL
|