A urgência pela
definição de convenções para o
gênero (que lhe aviso, não serei o responsável
por definir - sorry) pode muito bem se justificar em virtude
do crescente surgimento de novas bandas que optaram pelo estilo,
aceitando a idéia de abrir mão dos vocais e
concentrar o foco em frases de guitarras e criação
de climas, atitude que invariavelmente carrega consigo a capacidade
de convencer o público de que quatro ou cinco caras
conseguem subir num palco e entreter um número de diferentes
pessoas com diferentes aspirações musicais através
de músicas desvinculadas do imediatismo, que exigem
uma cumplicidade com o expectador. Aí então
fica a dúvida de como diabos existem bandas assim e
como podem continuar surgindo novidades em uma vertente com
tão poucos recursos para se inovar. Seria a demonstração
cabal de que as pessoas cada vez mais procuram refúgios
que lhes transmitam emoções verdadeiras? Ou
seria um caminho para bandas com péssimos vocalistas?
O Slint pode ter inaugurado a pedra fundamental
com seu “Spiderland” (que tinha muitos vocais,
diga-se de passagem) e o Tortoise mostrou as diferentes
possibilidades que o gênero podia oferecer (principalmente
com seu clássico “Millions Now Living Will
Never Die”), enquanto lá na Escócia
o Mogwai concedeu mais emoção ao estilo. Aos
poucos, a música dessas bandas ultrapassaram estágios,
evoluindo de quebradeiras baixo-guitarra-bateria para o
flerte responsável com instrumentos incomuns para
o rock, como o xilofone, o sopro e os teclados. À
medida que barreiras foram quebradas, o estilo passou a
oferecer um menor número de possibilidades, culminando
em discos com tendência repetitiva (“Standards”
do Tortoise) ou mesmo com menor fator de inspiração
(“Happy Songs For Happy People” do Mogwai).
Tais fatos colocavam em questão a validade do gênero,
uma vez que o esgotamento das possibilidades poderia sim
colocar um fim prematuro ao que vamos chamar de movimento,
idéia que confesso, passou sim pela minha cabeça.
Podia me enxergar colocando meus CDs de post-rock dentro
das gavetas, de saco cheio da infinita repetição
e desinteressado pelo o que essas bandas teriam a mostrar
no futuro. Eis que escutei “The Earth Is Not A Cold
Dead Place” e minhas esperanças foram revigorados.
Brilho é o que o Explosions In The
Sky nos mostra. Enquanto Slint caminhava amargamente sobre
sombrias lâminas afiadas e o Mogwai expelia desencanto
melancólico sônico, os texanos (nota do redator:
O Texas do QotSA, do Trail Of Dead e do Polyphonic Spree
é uma terra abençoada) do Explosions In The
Sky deixam suas veias abertas, permitindo ao ouvinte compartilhar
das múltiplas emoções imediatas que
compõem as cinco longas faixas do CD. Tapeando as
limitações que a escolha musical deles impõe,
ainda mais por se tratar de uma banda com o bom e velho
guitarra-baixo-bateria, eles parecem entender que a química
que lhes envolve é perfeita para transmitir emoções
pela combinação de seus instrumentos. A maneira
que encontram para ultrapassar a ausência de vocais,
que convenhamos, podem ser 90% da personalidade de uma banda,
é através da construção de ricas
melodias, que nos devolvem emoções de forma
bem mais imediata e igualmente intensa do que fazem as bandas
citadas nessas linhas. O disco não exige que você
se tranque a sete chaves para digeri-lo, tampouco solicita
uma dose cavalar de paciência para se adaptar a ele.
O poderio melódico dos rapazes é tamanho que
logo nos primeiros minutos de “First Breath After
Coma” você já está conectado ao
que está rolando entre os instrumentos, participando
da triste e esperançosa paisagem sonora que está
a começar, sem que isso exija uma dedicação
exacerbada de sua parte, querido ouvinte (obviamente, a
experiência pode não ter os mesmos bons resultados
em um cruzamento de trânsito às seis da tarde,
mas isso todos nós que gostamos de post-rock já
sabemos). “The Only Moment We Were Alone” usa
aquele esquema post-rocker que você já manja:
os minutos de construção de melodias, de dedilhados
introspectivos que, após uma auto-reconhecimento,
entram uníssonos com o restante dos instrumentos
e explodem (sacou a conexão?) em momentos de emoção
e sinceridade. O resultado funciona tão bem que as
faixas seguem como se fossem uma coisa só, uma bela
história de quarenta e cinco minutos que, ao invés
de convidar o ouvinte a um stop lá pela sua metade,
instigam-no a acompanhar a banda por apenas mais um momento
de pura beleza. “The Earth Is A Dead Cold Place”
não tem letras, não passa mensagens literais,
mas provoca sentimentos e emoções que o título
do trabalho nos auxilia a digerir, a fustigar: não
importa o quão profundos nossos abismos possam ser,
há sempre uma redenção, um acorde para
nos confortar (uau...).
Junto com os brasileiros do Hurtmold,
o Explosions In The Sky concede novo fôlego aos nossos
exigentes ouvidos e passa a candidato a próxima banda
cult que vai aparecer em listas de “o que estou escutando”
e “meus artistas favoritos”. A boa receptividade
que a banda vem recebendo confirma que as pessoas vem buscando
novas alternativas sonoras, recebendo discos como “The
Earth Is Not A Dead Cold Place” como um garantido
retorno para ouvidos ávidos por emoções
verdadeiras. Que o post-rock permaneça instrumental,
sem interações claramente humanas, capaz de
oferecer respostas em sons universais para o mais despreparado
ouvido.