O que era para ser uma consagração,
com a conquista de um espaço definitivo acabou se
revelando uma decepção, num baque que o Lemonheads
nunca se recuperou completamente até o fim dos seus
dias. Se muita gente até hoje não leva a música
de Evan Dando a sério, muito se deve a "Come
On Feel The Lemonheads", e mais precisamente às
atitudes de Evan na época. Isso significa que o disco
é um desastre? Não, até longe disso,
as grandes canções estão lá.
Mas simplesmente o disco não funciona como um todo,
com uma série de momentos dispensáveis e idéias
mal-acabadas. Isso se revela de forma mais gritante a partir
da segunda metade do disco, que exige uma boa dose de paciência
do ouvinte.
"Come On Feel" começa muito
bem, com uma seqüência de boas músicas.
Os semi-hits estão todos no início, o pop
rock certeiro de "The Great Big NO" e a singela
"Into Your Arms".
A balada "It's About Time", já
testada e aprovada na estrada bem antes de entrar no disco
e a veloz mas não furiosa "Down About It"
são outros dois grandes momentos. "Paid To Smile"
tem belos versos, mas o refrão não segura
e o final é meio entediante. Como várias faixas
do disco, conta com a participação do vocal
meigo de Juliana Hatfield, que foi um diferencial no álbum
anterior do Lemonheads, mas em "Come On Feel"
traz alguns momentos duvidosos.
"Big Gay Heart" é uma balada
ao violão com guitarra steel. Foi até lançada
como single, embora a temática restritiva da letra.
A música é boa e o trecho "Do you have
to try to piss me off 'cause I'm easy to pleeeeeease"
culminando com a quebrada na bateria é especialmente
marcante, mas o refrão é uma martelada, quase
uma lavagem cerebral. Repete "big gay heart" em
versinhos tolos nada menos que dezesseis vezes. Um pouco
demais não?
"Style" é a música
mais queima-filme do disco, falando abertamente do uso de
drogas do vocalista. "Don't wanna get stoned / but
I'm not wanna not get stoned" dá a idéia
de como andava a relação de Evan Dando as
drogas na época. Aliás, em cada um dos três
últimos discos do Lemonheads há uma música
sobre drogas. Enquanto a primeira, "My Drug Buddy"
era uma verdadeira declaração de amor, "Losing
Your Mind" (de Car Button Cloth, de 1996) foi o último
capítulo, gravado direto do fundo do poço.
A entorpecida "Style" está no meio do caminho.
Revela o impasse na letra que não sai do lugar. (=prisão?)
"Rest Assured" é mais um
rock, não tão bacana quanto "Down About
It", mas dá o seu recado. A divertida "Dawn
Can't Decide" cruza a fronteira entre a boa-intenção
de soar espontâneo e o feito "nas coxas",
com letra improvisada e um tanto sem sentido, soando descartável.
"I'll Do It Anyway" é daquelas canções
meiguinhas de Evan Dando. No refrão, Evan divide
os vocais com Juliana Hatfield numa linha bem Leno &
Lilian, Luan & Vanessa ou algo que o valha. Pareceu
caricato, forçado.
O disco perde o pique de vez com a repetição
de "Syle", rebatizada como "Rick James Style"
em uma versão chatíssima em câmera lenta,
que conta com a participação de (adivinhou?)
Rick James. James foi músico funk de muito sucesso
nos EUA durante os anos 70/80 mas enfrentou problemas judiciais
por uso de drogas que interromperam sua carreira por diversas
vezes. Infelizmente, a participação dele no
disco do Lemonheads pesa apenas como curiosidade e pouco
contribui para evitar o skip para a próxima faixa.
De qualquer forma seria difícil levantar
o disco depois da segunda "Style" e a tarefa coube
a simpática "Being Around". De letra bobinha
e engraçada, talvez "Being Around" funcionasse
bem em outro contexto mas aqui soa dispensável. Dá
a impressão de fórmula gasta, é mais
uma canção leve de violão com guitarra
steel acompanhando. Na seqüência, mais violão
(sem a guitarra desta vez) surge com "Favourite T",
a balada mais delicada e emocionada do disco, com Evan cantando
baixinho próximo ao microfone. "Favourite T"
é mais uma prova de como Evan Dando não levou
a sério esse disco, a letra é uma verdadeira
ode a sua... camiseta favorita.
"You Can't Take It With You" é
o último lampejo do disco, com um arranjo interessante
de guitarra e uma melodia verdadeiramente boa. Até
que desacelera, engasga e entre risos Evan Dando manda ver
um encerramento com uma letra de auto-ajuda sarcástica
de gosto duvidoso. Não teve graça, Evan.
Acabou? Ah, sim. Ainda temos "The Jello
Fund", com seus 15 minutos de duração
de tédio entre brincadeiras ao piano, pitadas de
hard rock e barulhinhos de estúdio.
É difícil não ouvir
Come On Feel sem ficar com a impressão de algo incompleto,
mal-acabado. Poderia ter sido um grande disco mas ficou
no meio do caminho, e no final das contas é apenas
um punhado boas músicas perdidas no meio da bagunça
que se tornou a carreira do Lemonheads na época.