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Após
um longo período de hibernação,
o Tool lançou em 2001, seu terceiro trabalho
(sem contar o EP Opiate e o box Salival), intitulado
Lateralus. E os fãs não poderiam ter ganho
presente melhor. Lateralus segue fielmente a tônica
das músicas do grupo - canções
longas, com passagens amarguradas e furiosas - mas que
possuem um teor mais bem construído, apontando
o álbum como o mais maduro da banda até
então. |
"The Grudge" é
um exemplo claro de como o Tool está mais refinado.
Neste épico de quase nove minutos, a técnica
de Adam Jones está mais apurada, alternando passagens
de guitarra simples com momentos mais elaborados. E são
exatamente nas passagens mais simplórias de guitarra
em que o baixo de Justin Chancellor brilha: neste álbum,
o baixista pôde mostrar toda sua técnica, e não
apenas terminar o trabalho começado por Paul D'Amour,
como fez em Ænima.
"Eon Blue Apocalipse"
é uma vinheta, com estilo mais "zen" impossível.
O timbre da guitarra com ecos discretos lembra trilhas incidentais
de filmes com cenas no deserto ou em montes budistas...
"The Patient" é
a primeira música em que Maynard mostra o que aprendeu
com as melodias açucaradas do A Perfect Circle. Seu
timbre está mais baixo e delicado, encaixando de maneira
coesa com o clima repetitivo e quase entediante ("a groan
of tedium scapes me") dos primeiros minutos da faixa.
Mas logo os vocais fazem uma harmonia majestosa em combinação
com os riffs da parte distorcida, que é extremamente
vertiginosa e intensa.
"Mantra" serve apenas
como uma introdução estranha e curiosa para
"Schism". Mais uma vez, o tal "toque budista
das Arábias"(!) reaparece.
"Schism" seria a
música mais acessível de todo o disco, mas que
fique claro que, em termos de Tool, "acessível"
não se equipara ao conceito de "música
pop". A faixa é construída ao redor de
variações da linha de baixo de Justin (um dos
mais belos riffs de baixo que já se ouviu), que mais
uma vez mostra sua delicadeza melódica aliada com uma
técnica singular. Incrível como os instrumentos
e a voz de Maynard soam extremamente interligados e únicos
ao mesmo tempo ("I know the pieces fit").
"Parabol" e "Parabola"
encontram-se separadas em faixas distintas, mas na verdade
elas se completam, como foi visto no vídeo onde as
duas aparecem juntas. "Parabol" começa de
maneira soturna, contida e densa, com o baixo e guitarra (ambos
com pesados efeitos de chorus) trabalhando uniformemente,
enquanto Maynard murmura pacificamente como nunca. Mas logo
a distorção crescente de "Parabola"
toma terreno com uma microfonia, mostrando uma variação
mais pesada do riff da faixa anterior, sem perder a sutileza
melódica da antecessora.
"Ticks & Leeches"
começa com uma introdução tribal de bateria,
com o baixo antecedendo a guitarra furiosa - porém,
técnica - de Adam Jones. É a música mais
agressiva do álbum, onde Maynard rasga sua voz de maneira
inigualável. Esta foi a última faixa de Lateralus
a ser gravada, e após isso, o vocalista não
conseguia alcançar notas altas durante algumas semanas!
Por esta razão, o Tool não costuma tocá-la
em muitos shows...
"Lateralus" (ou "Lateralis",
como apareceu em algumas prensagens do álbum) começa
com exatos 1:12 de suspense, para depois dar lugar a um peso
rasgado e consistente. Belíssimo mini-solo de Adam
Jones, que logo cessa para voltar ao suspense da introdução,
crescendo lentamente até chegar a uma cacofonia da
guitarra. No fim, a faixa chega num clima pesado e arrastado.
Uma das mais impressionantes composições da
banda, chegou a ser dedicada à Layne Staley, vocalista
do Alice in Chains, em um show, após sua morte.
"Disposition" é
a faixa com caráter mais progressivo do disco, com
Danny Carey dando uma amostra do que aprendeu em suas aulas
de percussão com o professor Aloke Dutta, enquanto
o talentoso Chancellor contribui com mais uma bela linha de
baixo.
"Reflection" segue
no clima iluminado da anterior, com uma introdução
bem demorada. Um espetáculo à parte, a banda
apresenta mais uma melodia mística. A percussão
de Danny Carey passa uma pesada atmosfera erudita, e Adam
Jones se reveza em riffs soturnos e linhas mais "hindus".
Mas é a voz de Maynard que dá o recado, mostrando
ao longo da faixa uma sonoridade que ecoa de maneira absoluta
e fantástica, tanto pela letra quanto pela sua interpretação,
incrementando a faixa de maneira especial.
"Triad" surge para
dar volta ao peso, mas desta vez de forma instrumental. "Disposition",
"Reflection" e "Triad" aparecem ligadas
na parte traseira do encarte, pelo fato delas terem sido concebidas
anteriormente como uma única música.
"Faaip De Oiad" é
uma faixa com barulhos estranhos e uma voz desesperada narrando
algo como se tivesse descoberto um fato sobre a Área
51, nos EUA, onde acredita-se que Ets são abrigados.
O narrador está tão nervoso porque o governo
estaria atrás dele para eliminá-lo, pois ele
agora sabe demais. E o disco acaba assim, com o narrador ficando
cada vez mais assustado, e o barulho de fundo aumentando até
que ele fica ensurdecedor e é extinto totalmente, como
se tivessem desligado o comunicador que o fugitivo estaria
usando.
"Toolices" à
parte, Lateralus mostra que o Tool pode avançar cada
vez mais dentro do contexto de art-rock que seguem por eles
próprios. Lateralus pode não ser tão
subliminar quanto Ænima (embora traga alguns sussurros
durante "Ticks & Leeches") ou cru quanto Opiate
ou Undertow, mas traz o mesmo teor obscuro e inigualável
da banda. Apesar de ter um ar mais divino graças aos
temas das letras, arte da capa e novos arranjos, o álbum
não só faz jus ao estilo do Tool, como também
aponta para uma direção mais abrangente e inovadora.
Pura evolução de uma banda que não tem
medo de se aprofundar em sua arte. |