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PRÓLOGO ::
(Tweedy e a enxaqueca. Wilco em guerra contra
a indústria fonográfica. O anti-comercialismo.
As tretas do lançamento de Yankee Hotel Foxtrot.)
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“Cedo neste ano, a
batalha de mais de cinco anos de Jeff Tweedy com o vício
a painkillers atingiu um estágio crítico”,
relata a reportagem do L.A Times, provocando calafrios nos
fãs do Wilco. Estaremos perto de perder mais um de
nossos heróis musicais para os narcóticos?
Estará Tweedy descendo pelo mesmo ralo que sugou
a vida de Nick Drake, morto após uma overdose de
anti-depressivos? Ficaremos logo órfãos de
uma das mais amáveis bandas americanas dos últimos
anos? “Parei de tomar os analgésicos para minhas
enxaquecas e me desintoxiquei sozinho”, contou Tweedy
em entrevista, “e após umas cinco semanas os
ataques de pânico estavam tão severos que precisei
ser hospitalizado”.
Esse quadro problemático
da situação de saúde do vocalista,
guitarrista e letrista do Wilco pode ser elucidador pra
entender essa nova fase da banda iniciada com o álbum
anterior, Yankee Hotel Foxtrot. A guinada anti-pop. O mergulho
no vanguardismo. A revolta dos laptops com vírus
e dos rádios fora de sintonia. A Poesia com P maiúsculo
invadindo as letras. O tom intimista, introspectivo, melancólico,
que passa o dominar sobre a antiga alegria summerteethiana.
O fato é que Jeff
Tweedy não é mais um adolescente, e seria
tolice esperar que ele continuasse a fazer rock and roll
simplão e despreocupado como fazia outrora. Casado,
paizão de dois filhotes, passando dos 35 de idade,
lutando contra a depressão e as cruéis enxaquecas,
o líder do Wilco é já um veterano do
rock americano. Sua banda passa a refletir agora a crise
de meia idade de um homem em luta com seus demônios
internos. O Wilco envelheceu.
Apesar de estar chegando
somente ao seu 5º álbum de estúdio frente
ao Wilco (7º se contarmos os dois volumes de Mermaid
Avenue, o tributo à Woody Guthrie composto em conjunto
com Billy Bragg), Jeff Tweedy já está marcando
o solo da música americana com suas pegadas há
muito tempo. Além de ter co-liderado entre 1989 e
1993 o Uncle Tupelo, importante banda que enfiou o caipirismo
no indie-rock e acabou fundando o tal do “alternative-country”,
ele, paralelamente aos trabalhos wilconianos, envolveu-se
com outras bandas (o Golden Smog e o Loose Fur), compôs
para o cinema (assinou sozinho a trilha de Chelsea Walls,
estréia de Ethan Hawke na direção),
contribuiu para o tributo a Gram Parsons (com uma versão
power pop delícia para “One Hundred Years From
Now” dos Byrds) e ainda teve tempo pra tirar umas
férias na clínica de reabilitação
para os fisgados pelos narcóticos. O longo caminho
percorrido deve tê-lo cansado dos caminho fáceis
da música pop, o que ajuda a explicar essa atual
“fase difícil” do Wilco.
Já tornou-se lendária
a epopéia em que se transformou o lançamento
do álbum anterior da banda, o hypado e fodão
Yankee Hotel Foxtrot, que saiu com mais de um ano de atraso.
A princípio, a Reprise Records., parte da Warner
Brothers, resolveu recusar o material apresentado pela banda
sob a acusação de ser “anti-comercial”.
“Mandamos pra eles um disco dos Bee Gees e eles o
trataram como se fosse o Metal Machine Music”, zoou
Tweedy em entrevista ao L.A. Times, fazendo referência
àquele que é, provavelmente, o mais-anti-comercial-dos-álbuns-anti-comerciais
da história, aquele amontoado de barulho que é
o M.M.M. do Lou Reed. A recusa da banda em deixar-se vergar
pelos interesses comerciais da empresa tornaram o conflito
inevitável.
Não houve acordo:
a banda comprou os direitos pelo álbum, pulou fora
da Reprise, tacou o álbum inteiro na Internet pros
fãs baixarem, saiu em turnê pelos EUA (descobrindo
com surpresa que o público cantava junto todas as
canções que, num sentido mercadológico,
“nem existiam”), até encontrar casa segura
na pequena Nonesuch Records (que, por ironia, também
faz parte do império AOL-Time Warner). Mais de um
ano depois de finalizado, o álbum finalmente pôde
ir às lojas em 2002, alcançando resultados
que esmurraram bonito a cara da Reprise e que são
interessantes pra se pensar a questão da indústria
fonográfica e do MP3, já que esse disco foi
uma espécie de refutação empírica
das teses que muitos pretendem inabaláveis: a de
que o MP3 destrói as vendas de CDs e a de que não
há público interessado em arte que pensa pra
frente e que vai aonde ninguém foi, só em
popices superficiais e fáceis de ouvir. Yankee Hotel
Foxtrot, além de louvado quase unanimemente pela
crítica, entrou direto no 13º lugar na parada
da Billboard, vendendo mais de 50.000 cópias na primeira
semana, passando do meio milhão de discos vendidos
depois, na melhor performance de vendas da carreira da banda.
A odisséia foi documentada em vídeo e virou
I Am Trying To Break Your Heart, documentário de
Sam Jones lançado em 2002. O brilho atemporal do
álbum o transforma, desde já, num dos mais
importantes discos desta década.
:: ESCREVENDO SOBRE
A MÚSICA EM SI ::
(dançando sobre arquitetura)
A Ghost Is Born, quinto
álbum de estúdio de Jeff Tweedy e sua turma,
prossegue na onda do álbum anterior de experimentos
vanguardistas, mas arrisca algumas explorações
de territórios ainda não trilhados. É
mais um álbum que as gravadoras grandes certamente
iriam taxar de “anti-comercial” e “pouco
apto à multiplicação de capital”,
no qual uma banda já veterana cai de vez no território
da Arte Cabeça.
As três faixas iniciais
oferecem o material que mais difere do restante da carreira
do Wilco. O estouro das guitarras alucinadas é a
maior das surpresas. Cheias de feedback e microfonia, as
guitarras entram rasgando a placidez de “At Least
That’s What You Said”, a primeira faixa, num
pandemônio digno da melhor fase do Crazy Horse. Na
lerda balada satânica “Hell Is Chrome”,
outra esquisita intervenção guitarrística
ocorre, dessa vez com algumas notas esparsas num solo manco.
É um dos raros exemplos de solo cujo número
de notas é inferior ao número de segundos
gastos para tocá-las, o que, pensando bem, é
bem audacioso. Num mundo onde os guitar heroes gostam de
empilhar 45 notas em cada centésimo de segundo em
seus solos, com as tradicionais caretas, piruetas e acrobacias,
há alguém que tem a manha de deixar uma única
nota soar por longo tempo, flutuar no ar, ecoar no ambiente,
dissolver-se no silêncio...
A terceira faixa, de longe
a música mais intragável da carreira da banda,
é o épico krautrock “Spiders (Kidsmoke)”,
que começa parecendo aquelas viagens rítmicas
quilométricas do Kraftwerk ou do Can, depois vira
rockão de acordes à la Neil Young, só
pra recair no groove hipnótico e minimalista, indo
embora para o reino das microfonias e para além dos
10 minutos de duração. Com jeitão de
poeta dadaísta, esquizofrenicamente balbuciando frases
aparentemente sem muito sentido, Tweedy recheia a letra
com “aranhas lançando redes de deduções
e melodias” e “cantando na brisa salina numa
praia de Michigan”. É a música mais
PROG da carreira do Wilco e um dos momentos críticos
de A Ghost Is Born. É aqui que suspeitas não
muito agradáveis podem se levantar nos corações
dos fãs: estará o Wilco no caminho de se tranformar
no Yes? Estará Tweedy no caminho do hermetismo poético
cada vez mais intrincado? Um novo estilo estará sendo
fundado: indie-prog? avant-garde alt-country? prog indie-folk
dadaísta?...
O fato é que Tweedy
não é nenhum guitar-hero (“demorei muito
tempo pra descobrir que tava tudo OK se eu não soasse
como Jimmy Page”, disse ele), e talvez esteja exatamente
na sua falta de técnica e de virtuosismo o seu charme
no comando das seis cordas. As três primeiras faixas
têm todas uma intervenção guitarrística
como nunca antes se ouviu na carreira do Wilco: barulhenta,
atonal, enlouquecida, caindo perto dos invencionismos da
dupla Thurston Moore e Lee Ranaldo. Isso se explica pela
presença de Jim O’Rourke, hoje já efetivado
como membro oficial do Sonic Youth, novamente comandando
a produção. O’Rourke ajuda a estabelecer
uma improvável mas valiosa ponte entre as duas bandas.
Passada a estranheza dessas
três primeiras faixas, recaímos em território
um tantinho mais tradicional e que se conecta com mais lógica
ao álbum anterior. No miolo do álbum se encontram
as faixas mais facilmente audíveis e gostáveis:
a balada beatle “Hummingbird” (que tem um solo
de violino que lembra “Jesus Etc.”), o indie-punk-dada
de “I’m A Wheel” (puro Replacements),
os power-pops folk (?) de “Handshake Drugs”,
“Theologians” e “Company in My Back”,
os ecos de Nick Drake nas melancólicas e silenciosas
“Muzzle Of Bees” e “Wishful Thinking”...
Uma coisa que não
escapa a um ouvinte mais atento é a tática
de destruição sonora que o Wilco bota pra
rolar em A Ghost Is Born: muitas faixas começam lerdas,
tranquilas, com o passo lento, e acabam por se dissolver
no completo caos. A harmonia e a paz do início da
canção se degenera e se transforma em barulho
puro em pelo menos 5 faixas (1,3,4,6,11). “Less Than
You Think”, por exemplo, leva isso ao extremo, esticando-se
pra mais de 15 minutos de duração, uns 12
deles gastos com barulheira arbitrária, o que é
mais do que qualquer ouvinte tradicional é capaz
de suportar. Não que isso seja gratuito, já
que um dos temas principais que dá pra notar no álbum
é justamente esse processo de esmigalhamento de algo
de valor – o relacionamento amoroso virando olho roxo
e falha comunicacional em “At Least That’s Waht
You Said”, as certezas da identidade virando dificuldade
de ter uma noção clara do “eu”
em “Handshake Drugs”, a vida virando morte em
“Wishful Thinking” e “Theologians”...
:: O PARTO DE FANTASMAS
CONTRA A BORRACHA DO TEMPO ::
(filosofia viajandona. interpretação poética.)
(Qual o tema deste álbum? Do que falam essas canções?
Qual o rio de sentido que corre por detrás dessas
poesias? Uma interpretação das intenções
ocultas do artista é sempre duvidosa e sujeita a
muitos erros, sei bem, mas isso não quer dizer que
tentar seja inútil. O esforço acaba muitas
vezes por virar forçação de barra e
o interpretante acaba por enxergar sentidos que o artista
nunca pretendeu comunicar; mesmo assim, acho que vale a
pena fazer essa tentativa de elucidar, de decifrar, de interpretar
e de aprofundar, ainda mais num álbum como esse,
que vem criptografado. Não trato aqui de todos os
“temas” do álbum, nem pretendo ter entendido
tudo [não tenho a mínima idéia do que
significa “Spiders Kidsmoke”, por exemplo, nem
sei qualé o “simbolismo” da cereja em
“I’m a cheey ghost”], mas, enfim, eis
aqui um compêndio de digressões viajandonas
sobre alguns versos de A Ghost is Born. Isso não
é uma ciência exata. O que eu tentei foi criar
um caminho de pensamento, um certo discurso, um certo contexto,
dentro do qual os versos fazem sentido.)
I. A MENTE BOMBA-RELÓGIO
(Ó CRUEL MORTALIDADE!)
“Your mind's a machine
It's deadly and dull
It's never been still
And its will has never been free”
----- “less than you think” ----
“Fill up your mind with all it can know
Don’t forget that your body will let it all go
Fill up your mind with all it can know
What would we be without wishful thinking?”
----- “wishful thinking” ----
O grande problema metafísico
que se encontra na persecução de conhecimento,
no acúmulo de memórias, no entesouramento
de conceitos e idéias - nesse processo de “encher
a cabeça com tudo o que ela pode saber” - é
que há uma grande possibilidade (pr’alguns
uma certeza) de que tudo isso tem bases unicamente cerebrais.
Uma banalidade, certo? Pode ser, mas com consequências
um tanto angustiantes. Como qualquer outro órgão
do organismo, o cérebro é perecível,
sujeito a deteriorar, irrevogavelmente condenado à
morte junto com o resto do corpo. Acumular conhecimento,
memórias e sentimentos num cérebro é
colocar tesouro num baú que possui uma bomba relógio
que não se pode desarmar. “Sua mente é
uma máquina, é mortal e idiota. Nunca esteve
parada e sua vontade nunca foi livre”. É terrível:
acumulamos idéias, conceitos, imagens, lembranças,
afetos, e no fim de tudo (ó destino cruel!) nada
resta disso tudo além de nossos miolos na barriga
dos vermes. Não será para sanar essa dificuldade
que as religiões tanto gostam de falar na Alma Imortal,
que sobreviverá à decadência do corpo
e do cérebro, e que “levará embora para
o Além” as nossas memórias, a nossa
experiência, o nosso conhecimento, sem o que não
há sentido em falar em um “eu” sobrevivendo
à morte? Aí então não precisamos
ficar atormentados com a idéia da futura nadificação
de toda a nossa vida interior. Essa crença nos deixa
sossegadinhos com a idéia de que tudo o que enfiamos
na cabeça irá sobreviver. “Não
se esqueça que o seu corpo deixará tudo passar”,
tenta nos persuadir Tweedy (persuadir a si mesmo, talvez?),
mas não cheirando muito à convicção.
Seria cruel e triste demais pensar que todo esse nosso acúmulo
de memórias, experiências e conhecimento é
em vão... É preciso ter fé. No fim
de tudo, nossa alma imortal, o “fantasma na máquina”,
sairá voando de nosso cadáver em decomposição
e estaremos ainda vivos. Podemos dormir tranquilos. “O
que seria de nós sem o pensamento positivo?”
II. A ARTE FANTASMÁTICA
(USANDO TRUQUES CONTRA A MORTE)
“Theologians, they
don’t know nothing ‘bout my soul”
“Where I’m going you cannot come”
“No one’s ever gonna take my life from me. I
lay it down. A ghost is born.”
---- “theologians” ----
“If I ever was myself, I wasn’t that night”
“It’s OK for you to say what you want from me
I believe that’s the only way for me to be
Exactly what you want me to be”
---- “handshake drugs” -----
“His goal in life was
to be an echo”
---- “humminbird” ----
“I will always die
I will always die
I will always die
So you can remember me”
---- “company in my back” ----
“Remember to remember
me
Standing still in your past
Floating fast like a hummingbird”
---- “hummingbird” ----
Apesar de dar certas mostras de misticismo e de fé
religiosa através do disco (“Deus está
conosco todos os dias”, canta em “Theologians”;
narra Deus abrindo um buraco no Céu em “Less
Than You Think”; usa o demônio como personagem
em “Hell Is Chrome”), Tweedy não se livra
com isso das angústias da mortalidade. Dá
pra farejar uma certa hesitação em aceitar
o dogma da alma imortal. “Os teólogos não
sabem nada sobre minha alma”. A ciência não
nos diz que somos todos matéria, amontoados de átomos,
entulhos perecíveis? Não se explica qualquer
sentimento, qualquer pensamento, qualquer memória,
partindo de reações químicas cerebrais
e sinapses neurônicas? Será inteligente confiar
cegamente na imortalidade da alma? E se nossas crenças
religiosas forem todas uma farsa e nada realmente sobreviver
à morte? Será razoável estar tranquilo
com os conteúdos inter-subjetivos repousando na prisão
do eu, ao invés de fazê-los sair, ao invés
de fixá-los no lado de fora? Será seguro deixar
tudo preso dentro do baú, crendo (sem razão
racional para tal) que não há bomba relógio
alguma? Já que não dá pra confiar demais,
é preciso retirar da mente tudo o que nela há
de útil, de importante, de auxiliador, de belo, e
grudá-lo numa matéria um pouco menos perecível.
A antevisão do aniquilamento da “mente”
na morte como impulso para a expressão artística.
“Pra onde estou indo você não pode ir”,
canta Tweedy, e não se sabe ao certo pra onde ele
vai e quem é que não pode ir junto. Quem não
pode ir, Jeff? Nós? Os teólogos? Sua mente?
Seu amor? Sua vida? Talvez todos eles juntos. Nada pode
passar “para o lado de lá”, pois não
há lado de lá. Mas nem tudo está perdido.
Ainda há maneiras de se construir túneis para
retirar da prisão do cérebro o que merece
ser tirado. Ainda há tempo para construir um monumento,
uma fotografia, uma réplica do “eu” que
irá ficar de pé quando o “eu”
cair. A obra. O artista transformado em objeto. O artista
espelhado, exteriorizado, materializado, fantasmado. Enfim
um triunfo sobre a morte: “Ninguém vai tirar
minha vida de mim. Eu a derrubei. Um fantasma nasceu. Um
fantasma nasceu. Um fantasma nasceu...”.
* * * * * *
“Algumas vezes
parece que o mundo está se tornando um lugar abismal.
Tudo parece estar muito indefinido e aterrorizante no momento.
Eu estive obcecado com isso, com essa questão do
‘como você faz para se definir de agora em diante?’
É por isso que há versos como ‘It’s
ok for you to say what you want me to be’ ou ‘His
goal in life was to be an echo’ ou ‘I’m
a wheel’. Tudo nesse disco está no processo
de se tornar... No final de tudo, você volta a se
definir através daquilo que você ama, e mais
importante, através das pessoas que você ama”.
JEFF TWEEDY
É assim que
que Tweedy descreve seu estado mental na época de
composição de A Ghost Is Born. A confusão
de não saber ao certo quem é, a dificuldade
em conseguir se definir, a suspeita de estar vivendo na
mentira, com o rosto escondido por trás das máscaras.
Quem sou eu? Quem é que decide quem sou? Sou o que
penso que sou, ou sou o que os outros pensam sobre mim?
O que os outros querem que eu seja? O que devo ser para
agradar aos outros? Por que não nos comunicamos corretamente
sobre o que desejamos uns dos outros? “Você
pode me dizer o que deseja de mim. Acredito que essa é
a única maneira para que eu seja exatamente o que
você quer”, canta Tweedy, antes de repetir várias
vezes a pergunta: “Exatamente o quê você
quer que eu seja?” Nessas perguntas parece se colocar
o dilema tweedyano. Os outros são necessários
para que uma pessoa possa se sentir bem consigo mesma, sempre
dizem os psicólogos. Não há auto-estima
pessoal que não seja intermediada pela estima alheia.
Além do mais, quando vacila a crença na alma,
os outros passam a ser a única maneira para que uma
vida ecoe... “Seu objetivo na vida era se tornar um
eco”. A arte, por um lado, e o amor, por outro, como
estratégias que alguém utiliza para penetrar
como imagem (como “fantasma”) na cabeça
dos outros. O mecanismo pagão da imortalidade, diria
eu. A Ghost Is Born é um ovo entregue a nós:
ele nos pede que o quebremos, que deixemos seu conteúdo
nos penetrar, que libertemos o fantasma tweedyano que lá
dentro repousa, e que ofereçamos a ele um refúgio
dentro de nós. “Sempre irei morrer, sempre
irei morrer, sempre irei morrer...”, grita Tweedy
como um disco riscado. “Lembre-se de se lembrar de
mim”.
Prometo que sim, Jeff.
"Some trees will bend
And some will fall
But then again
So will us all
Lets turn our prayers
Into outrageous dares
And mark our page
In a future age"
(jeff tweedy)