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A Banda :

Mr. Bungle
Formação: Eureka; Califórnia, EUA em 1984.

Formação:
Clinton (Bär) McKinnon: saxofone tenor e outros instrumentos
Daniel Mark Heifetz: bateria e percussão
Michael Allen Patton: vocais e teclados
Preston (Trey) Lea Spruance III: guitarras e teclados
Theo Lengyel: saxofone alto e teclados
Trevor Roy Dunn: baixo

Outros integrantes:

Ches Smith: percussão (1999)
Hans Wagner: bateria (1987)
James Rotundi: teclados (2000)
Jed Watts: bateria (1986)
Jeff Attridge: teclados (1999-2000)
Luke Miller: saxophone (1987)
Scott Fritz: saxophone (1986)
William Winant: percussão (1995-96/1999)

Biografia:

O Mr. Bungle começou como mais uma banda de colégio na cidade de Eureka, norte da California, por volta de 1984. O vocalista Mike Patton e o baixista Trevor Dunn, colegas na Eureka High School, já tinham contato musical em bandas insignificantes, chegando ao nome Mr. Bungle quando o guitarrista Trey Spruance juntou-se a eles. Com o saxofonista Theo Lengyel, o baterista Jed Watts e o trumpetista Scott Fritz, a banda revelou sua primeira encarnação (o nome "Mr. Bungle" foi tirado de um vídeo educacional que ensinava higiene pessoal e bom-comportamento ao público infantil, numa alusão ao personagem porcalhão que dava nome ao vídeo).


Cartaz de divulgação da primeira fita demo
Sua primeira fita demo, "The Raging Wrath Of The Easter Bunny", foi gravada na páscoa de 1986 e, obviamente, revelava toda a fúria adolescente e o descompromisso de uma rapaziada de 18 anos que estava concluindo o período escolar. Ouvia-se ali death metal e grind core acompanhado de outros instrumentos improváveis, num aglomero sonoro praticamente inaudível. Já em 1987, uma segunda demo foi gravada para distribuição entre as rádios locais.

"Bowel Of Chiley" foi registrada com Hans Wagner na bateria e Luke Miller nos sopros e mostrava músicas um pouco mais audíveis e definidas, fortemente vinculadas ao funk/ska, recheadas de guitarras sujas e letras imbecis (nos anos seguintes, esse K7 chegaria ao público através de bootlegs ilegais). Nesse período, os saxofones e trumpetes já se faziam mais necessários na definição do som do sexteto, embora o amadorismo e a inquietação adolescente predominassem. A formação ainda lançou uma outra fita demo em 1988, "Goddammit, I Love America", com sonoridade ainda bastante vinculada ao ska, revelando pequenos saltos na qualidade geral dos músicos como conjunto (nessa fase é bastante perceptível a influência de bandas de ska como o Fishbone).

A configuração mais representativa da banda se daria com a saída de Wagner e Miller, substituídos por Clinton Bär McKinnon (sopros) e Danny Heifetz (bateria) que gravou a última e mais cobiçada demo do Mr. Bungle: "OU818", em 1989. Essa gravação representa exatamente o meio do caminho entre os últimos suspiros adolescentes e o início da banda que tornaria-se objeto de culto em alguns anos. Com som bem definido, o formato da demo anterior permanecia, embora acrescido de novos detalhes e quebras frenéticas de ritmo, revelando-os compositores interessados em impulsionar sua música para os mais divergentes destinos. A acessibilidade de "OU818", comparada com os registros anteriores, deixava o som do Bungle forjado o suficiente para comunicar-se de forma mais eficaz com seja lá qual fosse o público disponível.


Imagens como essa tiraram o sono de muito marmanjo nos anos 90

No final de 1988, enquanto cursava Literatura na Humbolt State University, Patton presenciou um show do Faith No More, banda com relativa notoriedade no cenário universitário californiano. Entregou ao guitarrista Jim Martin uma cópia de "The Raging Wrath Of The Easter Bunny" e acabou sendo convidado a integrar a banda, logo após a demissão do então vocalista Chuck Mosely. Patton escreveu em duas semanas as letras de "The Real Thing", disco que estava sendo gravado por sua nova banda e lançado no ano seguinte. Em 1990, quando já percorria outras cidades e países em turnê com o Faith No More, viu o hit "Epic" estourar na América do Norte e na Europa, sendo tragado pela colosso do sucesso comercial. Foi exatamente esse súbito triunfo mercadológico do Faith No More que trouxe ao Mr. Bungle uma oportunidade única: a gravadora Warner, que era dona do passe do Faith No More em um de seus selos subsidiários, viu nos rapazes de Eureka uma possibilidade de pegar carona no sucesso do "emprego titular" de Patton.

Com contrato assinado, a banda entrou no estúdio ainda em 1991 (no mesmo ano em que o Faith No More tocou no Brasil) e, produzidos pelo referencial saxofonista John Zorn (uma grande influência para os músicos da banda), registrou seu debut numa gravadora major. Naquelas alturas, a demo "OU818" já estava plenamente esgotada, disputada a altos valores no mercado de gravações raras, e de certa forma alguma expectativa em torno do disco era nutrida pela horda recente de fãs do Faith No More, certos de que receberiam mais uma seqüência de faixas funkeadas embaladas pelas performances do carismático vocalista. Mas "Mr. Bungle", o disco, revelou-se tão paralelo quanto a condição da banda: funk e ska evoluídos a alegorias circenses e um senso macabro de ironia. Do humor negro representado pelos palhaços assassinos do encarte aos samplers pornográficos, o disco, composto por faixas esquizofrênicas e de difícil classificação, de forma alguma se relacionava com o rock de "The Real Thing".

A banda aproveitou várias faixas da demo anterior, devidamente contextualizadas na obra, repelindo os ouvintes menos pacientes mas atraindo toda uma horda interessada em mergulhar em outras formas de ouvir música. Para muitos, "Mr. Bungle" foi o disco que apresentou o experimentalismo e a falta de rigor musical como uma alternativa empolgante e interessante. Esses traços foram tão fortes que o próprio Faith No More foi inundado por iniciativas menos convencionais em seus discos seguintes.

"A Cotton Candy Autospy":
O livro que emprestou as magníficas
ilustrações para o primeiro disco

A satisfatória receptividade do disco de estréia somada com o interesse oriundo do sucesso do Faith No More proporcionou ao sexteto a possibilidade de promover turnês que revelaram mais um motivo de veneração por parte de quem os admira. Seus shows tinham apelo teatral, repletos de acessórios bizarros e máscaras que escondiam a identidade dos músicos, criando uma imagem oposta ao que os fãs de Patton poderiam esperar. Musicalmente, executavam sem piedade e com muita competência o caleidoscópio sonoro do álbum, sem regalias ou concessões para o público. Naquele momento, o Mr. Bungle já era uma banda cult, avessa ao sucesso comercial relacionado com o Faith No More.

Com a turnê encerrada, os músicos foram ao encontro de uma prática muito comum na trajetória da banda: os trabalhos paralelos. Patton gravou dois discos com o Faith No More e participou da cena avant-garde com o Naked City de John Zorn, Dunn embrenhou-se no jazz experimental de São Francisco. Spruance deu vida ao metal extremo de seu Faxed Head e chegou até mesmo a integrar o Faith No More para gravar as guitarras do álbum "King For A Day Fool For A Lifetime". Heifetz gravou com o Dieselhead, sua banda de traços country. Alguns deles deixaram participações em faixas individuais de outros artistas, outra prática freqüente para eles.

Tais experiências refletiram massivamente no segundo disco do Mr. Bungle, "Disco Volante", de 1995. Lançado sem muito alarde, com Patton e seu Faith No More já um tanto afastados da grande mídia, o álbum persiste como fruto de devoção de muitos apreciadores de música experimental. Totalmente desvinculado do disco de estréia, "Disco Volante" mostrou um amadurecimento impressionante dos músicos, com composições arrojadas e muita competência na utilização dos referenciais avant-garde coletados durante o período de trabalhos paralelos.


Peixe-víbora: finalmente revelado o animal na capa do "Disco Volante"

Toda a experiência com funk iniciada nas fitas demo e sacramentada no disco epônimo foi deixada de lado, dando lugar a músicas mais experimentais e meticulosamente elaboradas, sobressaindo-se em vários momentos em relação a mestres como o próprio Zorn. Sombrio, "Disco Volante" usava múltiplos idiomas, mesclava sonoridades eletrônicas com música étnica, recorria a trilhas de desenho animado e não poupava oportunidades de flertar com os mais impensados gêneros musicais. Para muitos, um dos mais interessantes discos de música experimental já lançado. Uma versão limitada em vinil ainda incluía um single de sete polegadas com uma faixa inédita gravada por Spruance, Dunn e Heifetz, chamada "The Legendary Paper Project By The Secret Chiefs Trio". Essa brincadeira se transformaria mais tarde no principal projeto de Trey Spruance.

O status cult da banda tomou proporções ainda maiores, oportunizando turnês por Estados Unidos, Europa e Austrália (com shows de execução impecável e muitas covers inusitadas). Para essas turnês, o grupo contou com a participação do percussionista William Winant, que havia contribuído também com as gravações de "Disco Volante". Ao final das turnês de divulgação, a banda entrou mais uma vez em suspensão para que seus integrantes participassem de outros trabalhos. Patton gravou em 1998 o último disco com o Faith No More, "Album Of The Year", além de dois álbuns solo de registros experimentais, lançados pela gravadora Tzadik de John Zorn.


Patton abduzindo a platéia
Participou também de inúmeros shows de improviso na cena avant e de incontáveis gravações com os mais diversos artistas (inclusive com o Sepultura). Spruance, Heifetz e Dunn lançaram álbuns integrais do projeto The Secret Chiefs Trio (pelo selo fundado por Spruance, o Web Of Mimicry). Spruance ainda gravou com o Faxed Head, Dunn participou de mais trabalhos ligados ao jazz, contribuindo com Zorn e dando início ao seu projeto individual, o Trevor Dunn Trio-Convulsant. Heifetz seguiu com o obscuro Dieselhead.

O último disco do Mr. Bungle foi lançado em 1999 novamente pela Warner. "California" não tinha mais a participação de Theo Lengyel, contrariado com os rumos musicais adotados pelo grupo. Musicalmente, "California" apresentava uma abordagem menos desbravadora, embora não abrisse mão da inquietação sonora. Um pouco menos esquizofrênico, o conteúdo revela uma banda calejada aplicando suas experiências recentes de forma bem perceptível.

Há traços do trabalho do The Secret Chiefs Trio (na surf music e na forte colaboração de música étnica), grandiloqüência digna de Las Vegas nos arranjos elaborados e nos vocais de Patton e uma massiva influência de trilhas-sonoras a-la Ennio Morricone. O resultado acabou sendo mais assimilável, evidentemente, na maneira Bungle que o termo pode ser utilizado. Enquanto "Disco Volante" agregou muitas idéias e incessantes mudanças de ritmos e gêneros de forma intercalada, "California" tem suas faixas bem distintas entre si, situando-as junto de seus compositores.

A última vez em que o Mr. Bungle jogou mini-golf

Para muitos fãs, o álbum não mantém o mesmo nível de desenvolvimento e maestria do anterior, embora ele revele a relativa facilidade do grupo em interagir com peças musicais tão complicadas. A sua divulgação iniciou com uma turnê nos Estados Unidos, sendo prejudicada por problemas legais entre a Warner americana e as subsidiárias que distribuiriam o disco em outros continentes. Tal contratempo obrigou a banda a fazer outras três turnês na América até que pudesse chegar à Austrália e à Europa na segunda metade do ano 2000. O sobrinho do músico Tito Puente, Ches Smith, integrou a banda na condição de percussionista em alguns shows, enquanto Jeff Attridge e James Rotundi foram responsáveis pelos teclados (um instrumento bastante importante na concepção de "California").

Encerradas as turnês, o Mr. Bungle entrou num hiato que aos poucos foi determinando o fim da banda. Mike Patton inaugurou projetos bem mais ambiciosos – o maior deles o desenvolvimento de um selo para lançar seus trabalhos e de outros músicos de verve experimental. Sua Ipecac já deu cria a algumas de suas bandas-projeto, como o Fantômas e o Tomahawk, e tem se mostrado o seu grande foco desde "California". Paralelamente, manteve a tradição de participar de um sem-número de gravações com diversos artistas. Trevor Dunn também é membro do Fantômas, talvez o mais expressivo projeto de seu colega Patton, além de já ter lançado mais um disco com o Trio-Convulsant (pela Ipecac em 2005). Segue firme com suas contribuições junto de Zorn e outros músicos de Nova York. Trey Spruance ampliou os trabalhos da Web Of Mimicry, lançando algumas bandas de caráter experimental e aproximando seu The Secret Chiefs Trio (sem Trevor Dunn) cada vez mais da música judaica. Clinton McKinnon e Danny Heifetz vivem na Austrália, na condição de chefes de família que flertam com música local.


De alguma maneira, essas camisas floreadas combinam com "California"

Nunca houve menção formal a respeito do fim do Mr.Bungle, embora as declarações emitidas pelos integrantes no decorrer dos anos tenham se encarregado de deixar a situação bem clara. Em uma entrevista à revista Rolling Stone em 2004, Patton apontou "problemas de funcionalidade coletiva" e "ciúmes e inveja de um determinado integrante lentamente eliminando a banda". O golpe final veio com uma postagem no site oficial de Trevor Dunn em agosto de 2005. Dunn: "O Bungle está morto. Por favor, assimilem isso. Estou indo a São Francisco no mês seguinte para finalmente aposentar nosso depósito. Uma penca de equipamentos abandonados pelos quais pagamos $225,00 mensais para ficarem acumulando pó durante cinco anos".

O Mr. Bungle deixou sua marca e seus discos até hoje são admirados por quem aprendeu a apreciar música menos acessível e mais desafiadora. Muitas bandas de vanguarda bebem na fonte sedimentada pelos californianos, que são freqüentemente mencionados em listas de discussão e suas gravações trocadas pela internet. Seu legado ainda se fez presente dissolvido nos trabalhos de seus integrantes, que se apresentam nas formas menos convencionais possíveis. Seus órfãos não têm muito do que reclamar.

 

Vicente Moschetti
fevereiro/2006

Álbums:
Discos oficiais Ano

Mr. Bungle

1991 (Warner Bros.)
Disco Volante 1995 (Warner Bros.)
California 1999 (Warner Bros.)
Demos, singles Ano
The Raging Wrath Of The Easter Bunny (demo tape)  1986

Bowel Of Chiley (demo tape)

1987
Goddammit I Love America! (demo tape) 1988
OU818  (demo tape)
1989
Mi Stoke Il Cigaretto (bootleg) 1992 (Brimatti)
D.R.I. Tribute: We Don't Need Society 2002 (Malt Soda)