21/08/2004 - Espaço Gang Music
- São Paulo (SP)
Curioso, fui conferir o recém-badalado
Hurtmold num show que seria o lançamento do novo álbum,
"Mestro". Motivado por inúmeras resenhas positivas
que li sobre a banda, resolvi optar pelo esquema de pagar vinte
reais pelo ingresso com o cd incluso. Ainda tenho uma certa resistência
a bandas da tal vertente "post-rock", à qual
andam associando o Hurtmold. Mas também embalado pelo que
já ouvi deles no "Cozido", resolvi arriscar.
Eis minhas impressões...
O show foi num lugar pequeno, no
espaço da Gang Music. Meio apertadinho, mas perfeito para
uma performance deste quilate. Não tem nada de "selvagem"
no som da banda, então acho que para o Hurtmold, lugar pequeno
não causa problemas.
Teve abertura de um "MC sem
DJ" (ele mesmo se apresentou assim), o tal Akin. Pois é,
neste meio "post-rock", hip-hop pode coexistir amigavelmente!
Mas a sonoridade do cara não era muito puxado para o tipo
de rap agressivo e cheio de gírias. Me pareceu um pouco rancoroso
- o Akin tinha seus temas centrados em uma certa insatisfação
com o cenário do rap nacional e umas experiências pessoais
com grupos de hip-hop - o cara teve língua até para
falar mal da Trama! No geral, até que a parte instrumental
do cara agradou (o show consiste apenas nele sozinho no palco, falando/rimando
sobre o som de fundo), mas tive a impressão que ele derrapou
em alguns momentos. Mas foi legal, e o Akin recebeu belos aplausos.
O Hurtmold demorou um pouco para
acertar os instrumentos. Tocaram faixas do cd split com o Eternals
(apontaria quais seriam, mas ainda não estou muito bem familiarizado
com as músicas da banda). Apresentaram um entrosamento impressionante.
O baixista é o que mais destoa do resto da banda; o cara
tem uma presença de palco bem solta (até estourou
a corda mais grossa do baixo na última música), e
é basicamente ele que faz as bases do som. A bateria também
segura tudo, mas por várias vezes aparecem partes - propositais
- onde pipocam diferenças absurdas de ritmo. Tem um groove
bom sem fazer firulas técnicas, como todo baterista de jazz
e funk faz exageradamente por aí. Fora o fato que, em certos
momentos, os teclados seguravam um ritmo meio "metrônomo"
e ele saía da bateria para tocar trompete, fazendo um duo
com um instrumento que eu arrisco a dizer que era um clarinete.
O resto do repertório foi
centrado no "Mestro" mesmo, sendo que tocaram quase o
álbum inteiro. No total, apresentaram umas duas músicas
com vocais, no máximo. Os vocais não se mostram como
algo de destaque, visto que o instrumental é o que chama
atenção na banda - teve até uma amiga que disse
que o cara cantava mal, e foi uma benção eles terem
optado por um som instrumental. As guitarras limitam-se apenas a
jogar linhas intermitentes quase hipnóticas (talvez esse
seja o "propósito" do post-rock: desconstruir todo
o mito que a guitarra tem, fazendo com que ela deixe de apresentar
um certo riff principal que sustenta a música, deixando as
guitarras apenas como um pano de fundo). Até as percussões
assumem um papel mais marcante que as guitarras!
Confesso que o Hurtmold possa ser
meio intragável para quem está mais acostumado à
boa e velha fórmula "verso-refrão-verso-refrão",
mas é difícil ignorar o talento dos caras. O que incomoda
um pouco é a idolatria que vem se formando ao redor da banda.
É um belo show, um grupo com uma proposta meio "desafiadora"
para os padrões musicais dominantes no Brasil - e até
acho muito bom que um som deste tipo esteja chamando a atenção
por aqui - mas ainda não me pegou de um jeito que vá
me transformar em fã incontestável, como observei
o povo à minha volta no local do show. Acho que ainda prefiro
ser ignorante e gostar das guitarras autoritárias.
Alexandre Lopes
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