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Review: Peloton

avaliação:
Certos discos servem como referência para uma banda, por mostrarem todos os seus "lados", misturando os elementos de toda uma discografia em poucos minutos de música. Não são necessariamente os melhores, mas servem para você indicar para aquele seu amigo que gostaria de conhecê-la, mas está indeciso sobre qual disco levar.

Smashing Pumpkins tem o Mellon Collie & The Infinite Sadness, Pixies tem o Doolittle, Grandaddy lançou recentemente Sumday e os Delgados tem Peloton, perfeito para quem gostaria de entrar no universo de uma das bandas mais interessantes do Reino Unido na atualidade.

Está tudo lá: o lo-fi insano e tosco da estréia Domestiques, a melancolia escocesa e os grandes refrãos de The Great Eastern, o jeitão épico de Hate e o sensacional senso melódico que sempre foi marca registrada da banda. Um disco completo, explorando diversas possibilidades sonoras sendo coeso, belo e delicioso de se ouvir.

Logo na primeira faixa, e também primeiro single, Everything Goes Around The Water, a banda escancara sua evolução sonora em relação à sua estréia. Um belíssimo dueto entre Emma Pollock e Alun Woodward, explorando diversas sonoridades, que vão de uma delicada flauta até quartetos de corda, passando pela pesada e distorcida guitarra do (maravilhoso) refrão cantado por Emma. Em seguida, outra grande música: The Arcane Model. Um clima infantil, lembrando os momentos mais circenses de Beatles, Blur e até Los Hermanos, serve de cama para o desengonçado e desafinado Alun cantar seus versos enigmáticos. O refrão é mágico: uma guitarra suja e lo-fi toca um riff ao mesmo tempo bobinho e encantador. Ao final, violinos e a guitarra lo-fi do refrão se fundem para fazer essa música ainda mais especial.

The Actress é uma daquelas músicas que qualquer compositor gostaria de ter escrito. Começa minimalista, intrigante, até cair em um refrão fantástico, cheio de peso, energia e punch. O vocal de Emma fica entre a melancolia do verso e a raiva do refrão (em que ela grita "book a room, book it soon, before I find you" como se ameaçasse alguém de morte), sendo fantástica em ambos os casos.

As faixas 4 e 5, Clarinet e Pull The Wires From The Wall respectivamente, acabam formando o grande momento do disco. Duas canções sublimes, mostrando todo o talento que os Delgados viriam a nos oferecer. A primeira é uma longa canção pop, com um arranjo brilhante - para dizer o mínimo -, e uma melodia não menos do que encantadora. É impossível não sentir um arrepio na pele ao ouvir os violinos tocando a maravilhosa introdução após os refrãos. Já a segunda, o grande hit do disco, mostra o brilhante senso melódico da banda. Uma belíssima música, levada na melancólica voz de Emma Pollock, onde um violão e um quarteto de cordas servem de cama para seus versos. Interessante notar também na linha de baixo, conduzida por Stewart Henderson. Grande música, grande interpretação de Emma. Merece o posto de maior sucesso da banda.

Em Repeat Failure, o disco de estréia da banda, Domestiques, dá as caras, e é possível até arriscar uma comparação com Jesus & Mary Chain e My Bloody Valentine. A música alterna momentos de pura quebradeira, com direito a uma densa parede de guitarras sobre o vocal de Emma, e momentos suaves, delicados, onde a menina canta quase como uma criança. And So The Talking Stopped lembra um pouco The Actress, na alternâncias de climas minimalistas e grandes refrãos. Não chega a impressionar, mas é uma boa música, assim como Don't Stop, melancólica balada que aos poucos atinge níveis consideráveis de barulho e distorção, juntando guitarras distorcidas e dissonantes com flautas e violinos.

Blackpool acaba sendo a única música fraca do disco. Cheia de mudanças de andamentos, efeitos e uma boa dose de experimentalismo, acaba soando chata e exagerada. O mesmo não acontece com Russian Orthodox, grande canção que mostra o lado mais cru da banda, graças a um riff certeiro e matador que serve como refrão.

Para fechar a obra, temos a excelente The Weaker Argument Defeats The Stronger. É uma das músicas que parece sintetizar todas as facetas desses escoceses: a suavidade e a beleza de The Great Eastern nos versos, a pancadaria de Domestiques no refrão e o andamento épico de Hate que vai permeando a música. Essa mistura acaba dando um sabor especial à canção, que foi lançada como terceira faixa de trabalho do disco.

Peloton é um grande disco, mostrando a nós o que a banda viria a fazer no futuro e o que ela havia feito no passado. Apesar de ser apenas seu segundo disco, os Delgados já se mostravam maduros o suficiente para produzir e fazer os arranjos complexos de músicas como The Actress, mas ainda eram anárquicos e barulhentos o suficiente para criar pepitas como Russian Orthodox. No final, um excelente disco de transição, feito por uma excelente banda.

Francisco Marés de Souza
out/2003