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A Banda:

Jeffrey Scott Buckley

Nascido em 17 de Novembro de 1966
Anahein, Califórnia, EUA

A Banda:

Jeff: Vocal, Guitarra
Mick Grondahl: Baixo
Matt Johnson: Bateria (93-96)
Parker Kindred: Bateria (96-97)
Michael Tighe: Guitarra

Biografia:

Sem dúvida alguma, Jeff Buckley foi um dos talentos mais peculiares e promissores na década de 90, não cumprindo todas as expectativas em torno de seu trabalho devido unicamente a sua precoce morte. Enquanto Kurt Kobain encabeçava o grunge e a crítica já rotulava o post-rock, Jeff Buckley surge com pretensão somente no nome herdado do pai, Tim Buckley, lenda ofuscada nas décadas de 60 e 70. Mas diferente do pai, Jeff ascendeu em meio a profundas revoluções musicais apenas com sua personalidade impactante e principalmente com sua incrível voz de menos três oitavos e meio, também uma herança de seu pai. Mesmo após sua morte, ao longo dos anos noventa até os dias atuais, Buckley é constantemente relembrado nas listas de “favoritos” de artistas consagrados como Robert Plant, Jimmy Page, Bob Dylan, Patti Smith, Thom Yorke e Björk, somente para citar alguns. A crítica também aponta, de forma quase unânime, seu único álbum, “Grace”, como um dos melhores daquela década e de todos os tempos.

Sua trajetória certamente renderia um roteiro para um filme de Curtis Hanson ou Cameron Crowe. Nascido nas redondezas de Orange County, na Califórnia, como Jeffrey Scott Buckley, foi o único e bastardo filho do fracassado casamento entre Tim Buckley e Mary Guibert, uma descendente de panamenses. Tim figurou como uma “segunda” estrela entre as décadas de 60 e 70, apesar de seu trabalho com o folk e o jazz ter sido aclamado pela crítica. Os dois casaram-se em 1965 e Tim abandonou Mary em 1967, pouco depois dela dar à luz Jeff. Em 1969 Mary se casou com Ron Moorhead, com quem viveu também por poucos anos, até 1973, e teve outro filho, Corey, meio-irmão de Jeff. Foi somente durante este curto tempo que Jeff teve realmente um pai, sendo chamado de Scott "Scottie" Moorhead e relembrado assim pela família até hoje. Em 1975, para selar uma infância já conturbada, Jeff vem a conhecer seu pai por apenas uma semana, depois da qual sairia modificado. De certa forma Jeff encontrara seu eixo musical na figura do pai, da qual podia ver o reflexo de um dom natural. Dois meses depois do encontro, Tim morreria por overdose de heroína aos 28 anos de idade. Aos dez anos, apesar da ausência do pai em sua vida e talvez para supri-la de alguma forma, Jeff decide assumir somente seu nome de nascença, com o sobrenome do pai e uma adolescência de experiências musicais pela frente.

Durante os anos oitenta Jeff passa a coletar o som de bandas como Led Zeppelin, Van Morrison – importantes influências em seu trabalho - The Smiths – que ele considerou “a única coisa que realmente valera a pena na música dos anos oitenta” - dentre outras bandas setentistas, principalmente. Começa a tocar guitarra já no colegial e aos dezoito anos muda-se para Los Angeles onde durante dois anos fez um curso no Musicians Institute (Guitar Institute Of Technology). Considerou aquilo “perda de tempo” apesar de ter feito importantes amizades musicais, tocando guitarra em várias bandas sob a influência de outras sonoridades como o reggae do Shinehead e o rock com influências de R&B do Group Therapy. Nesse período conheceu novas influências para seu trabalho no som de artistas mais refinados como Leonard Cohen, novelista e poeta canadense que se aventurou por uma carreira musical aclamada, Édith Piaf, ícone da música francesa e Nusrat Fateh Ali Khan, maior exemplar do qawwali, a música dos Sofis. Sonoridades mais clássicas como o jazz, a música folk e o blues também tornaram-se influências marcantes.

Em 1990 Jeff muda-se para Nova Iorque onde começaria definitivamente uma carreira, tocando nos pubs locais após estrear num show tributo para seu pai. Até então, Jeff ironicamente evitara cantar, talvez uma fuga às comparações com Tim Buckley, mas o que era para ser apenas uma homenagem ao pai torna-se uma apresentação debut e tanto do filho. Junto com o ex-guitarrista do Captain Beefheart, Gary Lucas, Jeff Buckley canta “I Never Asked To Be Your Mountain” de Tim, mas sua performance a cappella de “Once I Was” deixa o público impressionado, incluindo Lucas. Gary figurava como um guitarrista experimental e dividiu com Jeff a idéia de montar um duo. Em 1991 os dois montam “Gods And Monsters” na qual trabalham juntos em composições próprias e fazem elogiadas apresentações pela cena underground nova-iorquina. Com o sucesso da banda, Gary e Buckley estavam prestes a assinar um contrato para gravar um álbum, mas Jeff desiste da idéia salientando seu desejo de uma carreira solo. Um material contendo canções feitas pelos dois é lançado em 2002, “Songs To No One”.

Nos anos seguintes Jeff seguiria se apresentando nos pubs da East Village de Nova Iorque em performances acústicas, acompanhado apenas de sua guitarra. Atraiu instantaneamente a atenção de “olheiros” da Columbia, que em 1993 lhe propõem um contrato. Em dezembro era lançado o EP “Live At Sin-e”, com quatro canções ao vivo de Jeff no pub Sin-e, onde costumava tocar (e agradar) muito. Duas delas eram covers: da francesa Édith Piaf – "Je N'en Connais Pas Le Fin" – e "The Way Young Lovers Do" de Van Morrison. As outras duas eram composições próprias que apareceriam no álbum “Grace”: a primorosa “Mojo Pin”, feita em parceria com Gary Lucas, e “Eternal Life”.

Antes do lançamento de “Live At Sin-e”, Jeff e uma banda composta por Mick Grondahl no baixo, Matt Johnson na bateria e guitarra de apoio, entram em estúdio para gravar "Mojo Pin", "Grace", "Last Goodbye", "So Real" – Michael Tighe co-escreveu-a e tocou guitarra; depois viria a integrar a banda permanentemente – "Lover, You Should Have Come Over", "Eternal Life" e "Dream Brother", além de três covers: "Lilac Wine" de Nina Simone, "Hallelujah" de Leonard Cohen e "Corpus Christi Carol" de Benjamin Britten. Todas iriam compor o álbum “Grace”. Quando “Live At Sin-e” é lançado, o EP é avaliado como um promissor trabalho e apesar de não receber grande atenção da crítica, consegue fazer Jeff ter uma micro-turnê, que se estenderia para a Europa e o mundo após o lançamento já programado de “Grace” para o meio do ano.

De janeiro a março de 1994, Buckley e sua banda se apresentariam tradicionalmente em pubs e cafés pela América do Norte; a turnê estender-se-ia então para a Europa a partir daí. No dia 23 de agosto começaram uma turnê pela Irlanda e no mesmo dia o álbum “Grace” é lançado nos Estados Unidos. Os elogios rasgados ao álbum não demoraram para surgir, e os shows de Jeff Buckley começaram a ficar mais badalados. “Grace” impressionou a crítica pela textura de sonoridades e Jeff provava ter uma sensibilidade ímpar para hibridizar estilos sofisticados em baladas vicerais; as letras intrigantes falando sobre redenção, resignação e contato com o epifânico eram interpretadas magnificamente por uma voz de alta performance. A canção “Grace” não à toa dá nome ao álbum: uma entrega à morte embalada pelo mais sincero júbilo e pelos arranjos mais primorosos do álbum. Ao longo da turnê, Jeff ia conquistando elogios de vários artistas renomados como Paul McCartney e Bono Vox, sendo que este último definiu Buckley como “uma gota cristalina em um oceano de ruídos”.

Durante os anos de 1994 e 1995, Buckley fez inúmeras colaborações com outros artistas, das quais a de maior destaque é o duo com Patti Smith na música “Beneath The Southern Cross”, além de ter tocado Esraj – instrumento indiano parecido com um violão celo – em “Fireflies”. Essas duas canções estão no álbum “Gone Again” de Smith, aclamado pela crítica. Também colaborou com a vocalista do Nymphs, Inger Lorre, tocando guitarra, sax e cítara em “Angel Mine”, que integra o repertório de canções de vários artistas num tributo ao poeta Jack Kerouac; deu voz as canções “Jolly Street” do Jazz Passenger; “Taipan” e “D. Popylepis” com John Zorn e fez backing vocal, além de tocar guitarra, na canção “Faith Salons” com Brenda Kahn. Tocou baixo nas canções "If You Please Me," "Outdoor Elevator," e "Needle Men" – na qual também toca bateria – com Rebecca Moore.

No fim de setembro de 1994, Buckley e sua banda voltam para a América para se apresentarem no Sin-e em um concerto especial de fim de ano, além de uma participação de Jeff em um evento de leitura de poesias, o St. Mark's Church Marathon Poetry Reading, no dia do ano novo. Após a breve passagem pelos Estados Unidos, retornam a Europa para depois seguirem em shows pelo Japão. Em abril de 1995, recebe o “Gran Prix International Du Disque”, prêmio da crítica e indústria fonográfica francesa – já cedido a Bob Dylan, Bruce Springsteen e a Édith Piaf – e “Grace” é condecorado como disco de ouro. “Last Goddbye” conseguiu um 19º lugar na parada pop da Billboard e Jeff recebeu uma indicação como Melhor Revelação do Ano no MTV Music Vídeo Awards. Já a Academia Norte-Americana do Grammy deixou a estréia de Buckley passar em branco sem indicações ao prêmio em 1995.

A aversão de Buckley à mídia contribui bastante para seu sucesso em meios apenas mais intelectualizados. Mas, ainda em 1995, a revista People incluiu Buckley na sua lista dos “50 Mais Bonitos do Ano” na qual Jeff figurou no 12º lugar e não gostou nada de aparecer mais por sua beleza do que por seu trabalho. Realmente muitos se perguntavam de “quem era o novo rostinho bonito” em uma revista de tiragem popular. Enquanto isso Buckley e a banda iam e voltavam dos Estados Unidos, se apresentando também na Austrália onde Jeff conquistou elogios de seus ídolos do Led Zeppelin, Plant e Page, que ficaram impressionados com a performance de Buckley.

O ano de 1996 seria marcado principalmente pela turnê solo “fantasma” de Buckley que começou apenas em dezembro daquele ano. Sem avisos prévios de show, Buckley viajou pela América se apresentando tradicionalmente em pubs e cafés como sempre fizera no início da carreira, mas usando pseudônimos pitorescos como Martha & the Nicotines (me pergunto quem figurava como Martha), Father Demo, Smackcrobiotic, Crackrobats, Topless America, The Halfspeeds, Possessed by Elves (meu favorito...), dentre outros. A justificativa de Buckley era previsível: declarou não resistir àquele estilo de apresentação, no anonimato, sem pressões e cobranças: “Nessa situação eu tenho aquele precioso e insubstituível luxo de falha, risco, entrega. Eu adorava isso. Apenas estou reivindicando de volta”. Além desta turnê – que se estenderia pelo ano de 1997 – Jeff conduziu uma entrevista com Nusrat Fateh Ali Khan publicada logo em janeiro de 1996 pela revista Interview. Num estilo bem despojado de conversa, Jeff partilhava coincidências com Nusrat, como a herança musical paterna – Nusrat também é filho de um importante músico – além de perguntar sobre a vida, trajetória e a própria essência da música qawwali que, Jeff confessou, salvou sua vida quando estava em depressão. A nota de abertura do álbum “The Supreme Collection” é escrita por Buckley. Infelizmente o álbum só vem a ser lançado em agosto daquele ano, após sua morte.

“Grace” vendeu cerca de 300.000 cópias e isso não satisfez as expectativas comercias da Columbia. Logo, as pressões da gravadora sobre o segundo álbum de Jeff orientaram seu trabalho para um lado mais comercial. Tom Verlaine, fundador do Television, estava escalado para produzir o álbum, mas pulou fora do projeto após Jeff não gostar das canções que já haviam sido gravadas pelos dois. Nesta época Buckley já residia fixamente em Memphis, e na primavera de 1997 levou sua banda para lá, onde começariam a trabalhar no novo álbum, enquanto Jeff fazia suas apresentações solo pelos pubs da cidade; a última foi na noite do dia 26 de maio, mesma noite em que teria admitido sofrer de desordem bi-polar – maníaco-depressivo.

Na noite do dia 29, Jeff se reuniria com sua banda para começar as gravações das novas canções. Junto com seu amigo Keith Foti, estavam indo de carro para o local do encontro, quando Jeff decidiu parar antes no Porto de Memphis, às margens do rio Mississipi, para nadar. Keith ficou sentado às margens com um estéreo portátil que tocava “Whole Lotta Love” do Led Zeppelin, enquanto Buckley nadava e cantava junto com a canção. Keith disse que após um barco-reboque passar, foi guardar o aparelho de som no carro, para não ser molhado pelas ondas. Quando retornou, não viu mais sinal de Buckley e o chamou por mais de dez minutos. Sem resultados, avisou à polícia, que começou buscas pela região. Eram cerca de 4 horas da manhã quando um navio de passageiros chamado American Queen avistou o corpo de Buckley e o rebocou até às margens do Wolf River, afluente do Mississipi, exatamente no fim da rua Beale, o lendário berço do Blues. Porém, a polícia só encontrou o corpo no dia 4 de Junho: Jeff foi identificado por seu piercing no umbigo.

Jeff morreu aos 30 anos de idade, semelhança misteriosa com a idade de falecimento do seu pai, 28 anos. A autópsia não identificou sinais de qualquer droga no corpo de Jeff mas as suspeitas de que tenha cometido suicídio não são descartadas, levando em conta a declaração de Jeff pouco antes de morrer de que sofria de depressão e principalmente por ter entrado no rio completamente vestido, calçando botas pesadas. Para quem conhece à obra de Buckley e principalmente sua apreciação pelo qawwali – uma música de sofrimento – é impossível não fazer paralelismos, como o trecho intrigante de “Grace”: “And I feel them drown my name/ So easy to know and forget with this kiss/ I'm not afraid to go but it goes so slow...”. Logo, não é nada absurda a hipótese de suicídio, apesar da perícia ter concluído a causa da morte como afogamento acidental.

Em 1998 a Columbia lançaria o álbum póstumo no qual Jeff trabalhava em Memphis. “Sketches For My Sweet Heart The Drunk”, álbum duplo no qual o primeiro disco contém as canções feitas com Tom Verlaine e que Buckley rejeitou, e o segundo, as músicas na qual Buckley trabalhava antes de morrer, apresentando um experimentalismo avançado e que lembra mais ainda as influências de Led Zeppelin. Jeff recebeu uma ridícula indicação póstuma “de remorso” do Grammy para Melhor Performance Vocal Masculina em Rock por “Everbody Here Wants You” – detalhe: a canção é uma balada com influências bem sobrepostas de R&B. Ao longo dos anos seguintes, os fãs de Buckley foram desenterrando canções ao vivo, covers, colaborações e b-sides que formam o precioso e escasso legado de Jeff.

Em maio de 2000 são lançados o álbum “Mistery White Boy”, que mais do que capturar Buckley em apresentações ao vivo, compila momentos de interpretação marcantes, e o DVD “Live In Chicago” no qual aparece mais detalhes da vida de Buckley, como Mary Guibert, que co-produziu com Michael Tighe “Mistery White Boy”, com declarações sobre o filho. Nos anos seguintes seriam lançados “Songs To No One” (2002), mais trabalhos ao vivo e EPs, sendo o mais recente lançamento “Grace Legacy Edition”, uma edição especial de 10 anos de aniversário do álbum.

Completando quase uma década de seu falecimento, Jeff Buckley ainda permanece presente tanto pelos lançamentos póstumos quanto à gratidão de importantíssimos artistas que atravessaram a década de 90 sob a influência de Buckley: Thom Yorke deve seu falsete às influências do vocal de Jeff e o Coldplay também se baseou em seu trabalho. Jeff também ganhou várias canções tributo como “Memphis” de PJ Harvey, “Memphis SkyLine” de Rufus Rainwright, “Bandstand in the Sky” de Pete Yorn, “Just Like Anyone” de Aimee Mann e "Trying Not to Think About It" de Juliana Hatfield.

Apesar da brevidade de sua carreira, é sempre revelador e instigante encontrar antigos e novos trabalhos de Jeff Buckley. Como Bob Dylan disse: “Jeff Buckley é algo para se descobrir aos poucos e intensamente”.

Vlad Schilling
março/2006

Discografia:
Disco Ano
Grace 1994 (Columbia)
Sketches for My Sweetheart the Drunk 1998 (Columbia)
EPs e outros Ano
Live at Sin-é EP 1993 (Columbia)
Live from the Bataclan EP 1995 (Columbia)
Mystery White Boy: Live '95-'96 2000 (Columbia)
Live a L'Olympia 2001 (Sony)
Songs To No One 1991-1992 2002 (Columbia)
The Grace EPs [Box Set] 2002 (Sony)
Live at Sin-é (Legacy Edition) 2003 (Columbia)
Grace (Legacy Edition) 2004 (Columbia)