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Já
dizia a vovó: "Nunca deixe a raposa tomando
conta do galinheiro". No caso de Nick Oliveri,
o peladão e figura controversa do sensacional
Queens Of The Stone Age, a cada centímetro extra
que ganha em sua coleira, maior o estrago. Nick embarca
pela segunda vez em projeto solo, o Mondo Generator,
comandando as batutas e dirigindo os colegas Brant Björk
[Fu Manchu, Kyuss], Dave Catching [QOTSA] e Molly McGuire. |
Ser fã das Rainhas
da Idade da Pedra é sem sombra de dúvida uma
opção recompensadora. Não só somos
agraciados com discos memoráveis e indispensáveis
[os três, sem discussão] como somos bombardeados
com novidades nas entressafras entre os lançamentos
titulares. Dentre os inúmeros projetos de Josh Homme
e Nick Oliveri, o Mondo Generator é Nick Oliveri encarnado
em uma banda. Vertente punk da dupla, Nick já havia
largado um disco podre e tosco em 2000 através da independente
e pesadona Southern Lord. Cocaine Rodeo não só
antecipava a música "Tension Head" [ali chamada
"13th Floor"], como entregava toda veia punk e distorcida
que Nick geralmente poupa em sua banda oficial. O primeiro
álbum é uma distorção só,
soando como produzido em uma garagem do fim do mundo, regado
a drogas pesadas.
Como às vezes as coisas
que já estão boas podem ficar ainda melhores,
a galerinha do QOTSA juntou-se no final do ano passado à
turma da gravadora Ipecac [você já deve saber,
é o inquieto selo do igualmente sensacional Mike Patton].
Dessa forma, o selo de Josh Homme, a Rekords Rekords passa
a lançar em comunhão com a Ipecac alguns dos
próximos títulos do catálogo. Já
a Ipecac mostrou-se desde sua fundação um reduto
para músicos anti-convencionais, como que um asilo
de malucos que não encontram outro veículo para
destilar suas idéias inusitadas. Josh e Nick encontraram
o ninho perfeito para chocar seus filhotes Mondo Generator
e Desert Sessions [e sabe-se lá que outra maluquice
está por vir], com carta branca e incentivo para que
barreiras musicais sejam exploradas.
O novo álbum é
menos visceral, menos dark que o debut. Nick percorreu confortavemente
o mundo mainstream nos últimos dois anos, o que pode
ter provocado uma certa transformação em seu
projeto. As novas músicas têm mais pique, são
mais festeiras e convidam ouvintes menos ecléticos
a uma audição. A primeira faixa, "Meth,
I Hear You Calling" é uma espécie de vinheta
infernal, com entrada cavalar de bateria e direito a bumbo
duplo. Nick aplica os seus famosos urros guturais sob uma
série de trechos de conversas não identificadas.
A primeira música propriamente dita é "Here
We Come", e sua sonoridade é a mesma de outras
faixas do álbum. Um punk influenciado por bandas como
Turbonegro é gritado, seco mas igualmente obediente
à cartilha punk rock. Como ela, temos "F.Y. I'm
Free" que pode lembrar até um Mudhoney mais pesado.
Quem gosta de faixas como "Millionaire"
e "Quick And To The Pointless" do QOTSA, se sentirá
representado em "Do The Headright", "Open Up
And Bleed For Me" e "Girl's Like Christ" esta
última um hardcore com vocais podres à la Cannibal
Corpse. Momentos inusitados remetem às Desert Sessions
do companheiro Josh [listado como um dos convidado especiais
do álbum], como "Detroit" [de trabalhos instrumentais
e melódicos mais elaborados] e "Me And You",
uma western song tocada por um punk sujo. Baladas desérticas
como "All I Can Do" e "Day I Die" fazem
o rapaz trocar sua guitarra por um violão, como que
cantando asperamente frente a uma fogueira em meio ao nada.
"Jr. High Love", que nas Desert Sessions IV eram
um punk tosco, aqui aparece como um hard rock podendo fazer
você pensar até nessas bandas suecas como o Backyard
Babes. Nessa mesma linha, o rockzão "Like You
Want". A última música, "Four Corners",
tem a participação de Mark Lanegan dividindo
os vocais com o careca, talvez a faixa mais queenofthestoneageana
do disco. Climática.
Ao final do CD, entra uma seção
escondida, com um merchandising dos próximos lançamentos
que a Rekords Rekords promoverá. Sob o fundo de um
rock manhoso, cantado docemente por Josh Homme, o locutor
avisa que vem aí o debut da banda de "rock dançante"
Eagles Of Death Metal. Assim como anuncia as Desert Sessions
IX/X -- tendo como pano de fundo um instrumental fofo seguido
por uma pauleira que eu até agora não consegui
assimilar de tão boa. E ainda provoca, anunciando as
participações do CD: Dean Ween, PJ Harvey, Twiggy
Ramirez, Chris Goss, Josh Freeze, Dave Catching entre outros.
Do cacete.
A Drug Problem That Never
Existed é menos tosco e mais convidativo que o CD de
estréia, o que de certa forma me causou uma certa supresa
por estar sendo lançado por uma gravadora audaciosa.
Do catálogo da Ipecac, talvez seja o CD mais acessível.
Por outro lado, é um trabalho que privilegia o rock
puro e simples, e se você quer escutar um disco desbocado
e divertido que não impõe
segundas interpretações, esse álbum é
uma ótima escolha. Legítimo disco para sair
em major, mas como com esses caras a regra é complicar,
foi tudo ao contrário.
Vicente Moschetti
(publicado originalmente no blog Baby
Let's Rock!)
maio/2005
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