Lógico que não é exatamente
esse o caso do Posies, mas sim, a banda ficou melhor quando
acabou. Nos tempos em que estava na ativa, não se
encontrava uma linha escrita sobre eles que não tratasse
de alguns fantasmas que o Posies carregava: o carimbo 'made
in Seattle' e suas repercussões na sonoridade da
banda, o disco que era para ter sido um sucesso e não
foi, a pressão de estar numa gravadora grande, o
tal power pop e sua relevância e por aí vai.
Mesmo entre os fãs havia muita discussão,
o disco que ficou produzido demais, o disco que ficou pesado
demais, qual a influência da gravadora nisso tudo
e blá blá blá. É como se existisse
um sub-texto (vários, na verdade) que parecia inseparável
do que era o Posies, presente em tudo que a banda fazia.
Com o autodeclarado fim da banda, restou a MÚSICA.
Todo o resto perdeu o sentido. Foi a atitude mais inteligente
que Ken Stringfellow e Jon Auer poderiam ter tomado, foi
como uma libertação.
E o melhor é que o Posies não
chegou a acabar de verdade, apenas não mais existe
expectativa em torno deles. Tornou-se uma banda que toca
por prazer. Já foram lançados vários
discos (material inédito inclusive) e o Posies continua
se apresentando ao vivo quando dá vontade. "Ou
quando a conta bancária aperta", algum engraçadinho
poderia dizer. Não mesmo. O R.E.M. paga as contas
(Ken é um atual integrante da banda) e, convenhamos,
não serão shows para trezentas cabeças
que vão encher o bolso de alguém. Te liga,
reacionário.
In Case You Didn't Feel Like Plugging
In (2000) é um dos lançamentos póstumos
do Posies (teve coletânea, box set de raridades, disco
ao vivo e EP de inéditas). Como o bem sacado título
anuncia, é um acústico (dã) e documenta
a fase atual do Posies após o seu 'final', numa das
apresentações de Ken e Jon como um duo. Na
realidade, a banda sempre se resumiu nos dois acompanhados
de coadjuvantes, Jon e Ken fingiam que não era assim
e os fãs fingiam que acreditavam, numa lógica
meio Vampeta. E essa formatação do acústico,
com apenas dois violões e as duas vozes oferece as
músicas do Posies na concepção mais
básica possível, mostrando o rascunho do que
seriam sem um acompanhamento de banda e sem os recursos
de estúdio que tanto dividiam os fãs, entre
o grupo que queria cordas e requinte e o grupo que queria
peso. Nenhuma das músicas foi recriada para esse
formato, e o que poderia ser uma perda, acaba se transformando
num interessante exercício para Ken e Jon: segurar
o pique nas músicas mais rápidas apenas nos
violões ao mesmo tempo acrescentando mais sutileza
às baladas.
"Solar Sister" é um dos
pontos altos, com a dupla conseguindo manter os crescendos
apenas com os violões, é uma das grandes músicas
do Posies, ficaria bem em qualquer formato. Com o instrumental
todo consistindo apenas nos dois violões, em várias
músicas existem trechos onde ocorrem verdadeiros
'silêncios'. É o caso de "Believe In Something
Other", que tem um riff cheio de paradinhas que ganham
uma dinâmica mais acentuada num acústico como
esse. Em "Please Return It" chega a ser engraçado,
após o refrão há uma pausa total até
que o vocal (Jon) retoma o verso pronunciando um "eight"
no vazio, que por alguns segundos soa completamente alienígena
até a música ser retomada.
Já "Flavor of the Month"
ficou exatamente igual a versão de estúdio
mesmo que o original possua toneladas de distorção
nas guitarras e bateria pegada. É um exemplo de como
muitas vezes a embalagem que se dá a uma canção
pode seguir rumos diferentes sem que seja alterada a essência
da composição e o efeito no ouvinte. "Grant
Hart" já não ficou tão parecido,
mas é natural, pois o original pode ser considerado
como o mais próximo do hardcore que qualquer coisa
que o Posies tenha feito.
Dentre as músicas mais baladeiras,
"Suddenly Mary" é a que ganha mais no formato
violão, com belíssimas variações
no riff inicial e performance vocal muito inspirada e tocante.
"Precious Moments" já não agrada
tanto, ficando excessivamente melodramática com a
ênfase no vocal, mas não tinha como ser diferente.
O reduzido set list de apenas 10 músicas
cobre todos os discos de estúdio lançados
durante a carreira da banda, e justamente durante uma música
do primeiro álbum, Failure (1988) que ocorre
um momento especial do show. Em "I May Hate You Sometimes"
Ken e Jon cantam juntos desde o começo e mostram
o imenso entrosamento dos dois, é como se fossem
irmãos gêmeos tocando. Como se trata de um
lugar muito pequeno, se percebe com facilidade a reação
do público e durante o refrão dá para
notar algumas vozes acompanhando. Logo após o refrão
surge uma transição (aquilo que é chamado
de bridge ou ponte) com as tais paradinhas e silêncios.
E então Ken diminui a voz para que o público
cante também, a galera responde e o cara começa
a rir e pára de cantar com o público tomando
conta, soberano. Esse disco é um sinônimo de
show intimista. No começo da já citada "Suddenly
Mary" após a arrepiante introdução
vocal (que lembra uma canção de ninar), quem
termina a contagem antes dos violões entrarem é
um cara da platéia.
Outro momento curioso é durante a
pausa para troca da fita, creditado no disco e anunciado
no show como "Tape Change Break". É a fita
que está gravando o show, mas Ken faz uma brincadeira
sugerindo playback: 'cause actually we're lip synching'.
Hilário.
Sem a expectativa de quem segue uma carreira
de maneira mais ortodoxa (isso acabou para o Posies), In
Case... é um belo disco que certamente fez a
alegria dos fãs e eventualmente foi e ainda será
descoberto por aqueles que se interessarem pela música
dessa bela banda.