|
"Ok Computer" é a obra-prima
do grupo inglês Radiohead, tendo inclusive sido escolhido
pelos leitores da revista Q, em 1997 (ano do seu lançamento),
como o melhor álbum de todos os tempos. Os outros
dois discos da banda são também muito bons, "Pablo
Honey" de 1993 e "The Bends" de 1995.
|
Mas não vão muito além daquilo que a banda
parecia propor ser, ou seja, uma banda de rock alternativo
com excelentes músicas, mas todas, digamos, normais e convencionais,
nos padrões atuais (sendo que nestes dois primeiros discos,
o vocalista e compositor Thom Yorke já mostrava ter talento
para escrever letras tristes e auto-depreciativas).
Mas em "Ok Computer", eles extrapolam tudo aquilo
que já haviam feito. As letras e temáticas continuam as mesmas,
mas, musicalmente falando, é algo muito superior, e, porque
não, a frente de seu tempo. Belíssimas melodias, músicas com
estruturas mais complexas, uso bem dosado e extremamente harmonioso
(sim, isso é possível!) de elementos eletrônicos, teclados
bem encaixados, atuações inspiradíssimas de todos os membros
da banda (principalmente Thom nos vocais) e excelentes letras
fazem desse disco uma obra inesquecível.
Vale falar um pouco mais das letras escritas por Thom Yorke.
Elas vão muita além da rebeldia sem causa mostrada pela maioria
das bandas de rock desses últimos tempos. Thom demonstra nelas
certo desprezo pelo mundo atual, pelo modo de viver das pessoas,
enfim, pelo dia-a-dia típico dos humanos desse final de século.
"As pessoas acordam cedo demais para sair de casas onde
não gostam de morar, para ir à um trabalho do qual não gostam,
em um dos meios de transporte mais perigosos do mundo (carro)",
disse ele certa vez. Em suas letras ele quase sempre deixa
evidente esse seu descontentamente, mas de uma maneira meio
que conformada, sempre pregando uma fuga a tudo isso, para
se levar uma vida simples e espiritual (muito diferente da
vida que ele efetivamente leva, sendo um "rock star").
Praticamente todas as músicas de "Ok Computer" impressionam
pela sua beleza. Começando por "Airbag", com seu
andamento paranóico, baixo entrecortado, efeitos eletrônicos
esquisitos, e que possui uma letra estranha em que Thom fala
de outra de suas fixações (ligada diretamente com aquela do
dia-a-dia do homem moderno): acidentes de carro. "In
a fast german car, I'm amazed that I survived, an airbag saved
my life", canta ele no final da música. Não é a primeira
música do Radiohead que usa esse tema.
A segunda, "Paranoid Android", é o grande destaque
do álbum: belas melodias (sim, são mais de uma), excelente
trabalho de guitarras e uma estrutura diferenciada, como se
fosse dividida em movimentos, tendo, inclusive, sido taxada
por muitos como uma típica música de rock progressivo.
"Subterranean Homesick Alien" também é ótima, com
bela melodia e instrumentos bem atmosféricos (outra característica
notada ao longo do disco inteiro), e, pra variar, lirismo
no mínimo curioso ("I'd show them the stars and the meaning
of life, they'd shut me away" lamenta Thom Yorke mais
uma vez mantendo um distanciamento da humanidade).
"Exit Music (For a Film)" é a canção mais triste
do disco, onde Thom mostra explicitamente sua vontade de fugir
de um mundo no qual ele definitivamente não se encaixa. Essa
faixa tem um clima realmente melancólico e intimista, com
uma belíssima interpretação do vocalista, que mostra ter controle
total de sua voz.
"Let Down" é outra canção extremamente inspirada,
de uma beleza quase palpável, com seu instrumental envolvente
acompanhando de maneira perfeita o vocal, como se ambos fossem
uma coisa só. Nela, mais uma vez ouvimos Thom Yorke lamentar
a vida, e, em um trecho que deve entrar pra história, dizer
"One day, I'm going to grow wings, a chemical reaction,
hysterical and useless". Nesse momento, toda a música
parece mudar de maneira sutil, e um clima de "reação"
diante de tanta frustração e de quase imperceptível alegria
domina, em nova sintonia perfeita de instrumentos e vocais.
E o ouvinte? Bem, o ouvinte essa hora está nas altura!
A próxima, "Karma Police", também é linda, com uma
base de violão e piano bem simples. "Fitter Hapier"
é a música (?) mais estranha do disco, mas que é perfeitamente
compreensível conhecendo-se Thom Yorke. "Electioneering"
é bem alegre e empolgante, além de ser a mais acessível do
disco, com cara de hit radiofônico (sem que isso signifique
que ela seja simplesmente "legal", como a maioria
dos hits comerciais). No contagiante refrão, Thom canta: "When
I go forwards, you go backwards, and somewhere we will meet".
"Climbing the Walls" também é excelente, com muito
clima e andamento hipnótico. "No Surprises" é uma
bela balada que tem na sua letra o seu ponto ponto forte,
pois representa perfeitamente o que se passa na cabeça do
atormentado vocalista . "I'll take a quiet life. Such
a pretty house, Such a pretty garden. No alarms and no surprises"
chora ele no refrão. "Lucky" também é belíssima,
com um lindo refrão acompanhado perfeitamente pela guitarra
cheia de melodia. Thom parece ter um acesso de alegria em
meio a tanta tristeza e decepção: "It's gonna be a glorious
day! I fell my lucky could change". "The Tourist"
fecha perfeitamente essa obra-prima: mais uma canção hipnótica
e climática, com letras e vocais inspirados, melodia triste
e cadenciada, outra música inesquecível.
Resumo da ópera: um disco muito bonito, que vai além das fronteiras
do rock praticado atualmente. Isso pode não parecer nada simpático,
mas esperamos que Thom Yorke continue sendo um cara muito
triste e depressivo, para que assim continue nos presenteando
com trabalhos como esse! |