Não, isso não é uma viagem com ácido,
é apenas um rótulo para descrever o projeto
musical mais inusitado da música contemporânea,
o Sigur Rós, e seu melhor fruto, Agaetis Byrjun.
Em primeiro lugar, é bom colocar avisos
de restrição nesse disco, do tipo: "não,
isso não é música para qualquer um"
ou "é muito pequena a chance de você gostar
disso, e, para piorar, isso vicia". O som dos islandeses
não é parecido com absolutamente nada do que
foi feito antes na música pop, e suas inovações
talvez soem inacreditavelmente chatas em alguns ouvidos.
Isso é um fato, até porque o nome Sigur Rós
por si só já me deixava com sono há
alguns meses atrás. E, por maior que seja seu amor
pelas canções de nome curioso desse quarteto,
você jamais vai querer ouvi-lo em uma festa, ou na
rádio, ou no seu carro, durante um engarrafamento
qualquer. Isso é música para curtir sozinho,
lendo um livro, tomando um café ou simplesmente se
concentrando nas inexplicavelmente belas linhas melódicas
criadas por Jón þór Birginsson, Kjartan
Sveinsson, Georg Holm e Orrí Páll Dýrason.
Ou seja: se você quer se divertir, não perca
seu tempo e vá atrás do disco dos Pixies de
sua preferência.
Passado o "Parental Advisory",
vamos ao que interessa: Agaetis Byrjun o mais belo disco
produzido nos últimos anos. Não necessariamente
o melhor, ou o mais representativo, mas o que mostra as
músicas mais tocantes que o novo século ouviu.
É uma sucessão de viagens que duram entre
seis e dez minutos, recheada de guitarras tocadas com arcos
de violino, baterias a 10bpm, cordas e teclados esparsos,
vocais etéreos e melodias belas, impressionantemente
belas. Cada uma dessas canções parece ter
sido feita por um artesão, trabalhando cada detalhe
mínimo de sua obra sozinho, em um quarto isolado
do mundo, na ilha mais distante da Europa. E o resultado
só poderia ser uma obra-prima, perfeita por seus
pequenos detalhes, talvez melhores até do que a obra
como um todo.
Para ouvi-lo, é necessário
acima de tudo paciência. Não espere que o grande
momento lhe seja entregue de bandeja, logo nos primeiro
minutos. Todas as músicas do disco contam com longas
introduções, ruídos, versos arrastados
e suaves, que, com muita calma e serenidade, nos levam a
um clímax ao mesmo tempo inesperado e totalmente
óbvio. Mas nada é gratuito: os longos versos
de Agaetis Byrjun são essenciais para levar o ouvinte
às alturas, para mergulhá-lo nas profundezas
de seus sonhos, e entregá-los, finalmente, o recheio
das canções. E eu só digo uma coisa:
não há banda no mundo que atinja o clímax
de uma canção de forma tão contundente
quanto o Sigur Rós. É só ouvir obras-primas
como a doce "Staralfur", a tensa "Ný
Batteri" e a belíssima "Vidrar Vel Til
Loftárásá" que fica fácil
entender tudo o que falei até agora. Não é
algo que pode ser explicado apenas por palavras soltas:
é preciso ouvir e entender.
Por ser um disco dependente das sensações
do ouvinte, Agaetis Byrjun nunca será uma unanimidade,
assim como seus criadores. Mas a força das canções
aqui presentes com certeza fascina quem consegue superar
o estranhamento inicial. A beleza dos timbres, a contundência
dos refrãos - que não são exatamente
refrãos - e o etéreo canto de Jon þór
tem o estranho poder de hipnotizar o ouvinte, de fazê-lo
perder sua consciência pelos setenta e quatro longos
e bem aproveitados minutos do disco. Uma estranha obra-prima,
que pode tanto viciá-lo quanto repeli-lo para sempre.
Ouça uma vez na vida. Se quiser ouvir uma segunda,
é melhor começar a procurar uma escola de
islandês para entender as - bizarras - letras do disco,
porque você já está fascinado, provavelmente
para sempre.