O Sonic Youth
pode ser considerado com um fenômeno musical, uma vez que
o sucesso e o reconhecimento que a banda possui é bastante
improvável entre grupos que não tem compromisso com padrões
musicais que atualmente imperam no mercado, e muito menos
com a postura mainstream que grande parte dos grupos de sucesso
comercial onstentam hoje em dia. Muito pelo contrário. E talvez
seja por essa aversão à padrões e convenções reinantes, pela
honestidade artística e coragem de fazer música pela música
sem medo de experimentar, e por fim, pela atitude "do-it-yourself"
que a banda sempre pregou, talvez sejam por esses motivos
que o Sonic Youth possui uma legião fiel de fãs e reconhecimento
por parte da mídia, tendo se tornado assim um ícone da música
e cultura alternativa americana dos anos 80 e 90.
A história da banda inicia-se no final da década de 70, onde
os movimentos undergrounds de Nova York proliferavam-se e
chamavam a atenção de muitos jovens artistas e músicos. Entre
esses estavam Lee Ranaldo e Thurston Moore, que se mudaram
para a Big Apple interessados justamente em algumas manifestações
musicais que rolavam por lá, como a "No Wave" e
o próprio punk rock. Juntos, eles tocaram na "guitar-opera"
de Glenn Branca, que era um músico que organizava apresentações
onde haviam sempre muitas guitarras, chegando as vezes a terem
seis delas tocando ao mesmo tempo. Tanto Ranaldo como Moore
já haviam participado de pequenas bandas alternativas anteriormente
(a última de Ranaldo foi o The Pluks e a de Moore foi o The
Coachmen). Durante o início da década de 80, Moore estava
namorando com a baixista Kim Gordon, que também era muito
interessada em rock alternativo e também já havia participado
de alguns grupos, como CKM. Assim, não demorou para que Moore
e Gordon resolvessem formar uma nova banda, influenciados
pelo cenário underground em que viviam e entusiasmados com
os resultados que Glenn Branca alcançava com sua "guitar-opera".
No início de 1981, Moore volta a encontrar com Lee Ranaldo
em um evento chamado Noise Festival, e lá o convida para ingressar
na banda que ele e sua namorada estavam montando. Ranaldo
aceita de imediato e com a entrada do baterista Richard Edson,
nasce o Sonic Youth.
No verão de 1981, a banda começa a participar de vários festivais
no circuito alternativo local, contando com a tecladista Ann
DeMarinus. Ann não fica muito tempo, e não chega nem a participar
das gravações do primeiro trabalho da banda, um EP auto-intitulado
lançado em 1982. O disco saiu pela gravadora de Glenn Branca,
a Neutral Records, e é uma pequena amostra do que viria a
se tornar o som característico do Sonic Youth: algo bastante
alternativo, com bem dosadas porções de experimentalismo e
melodia.
No início de 1983, o baterista Richard Edson deixa a banda
para seguir a carreira de artista de cinema, chegando inclusive
a participar de algumas produções americanas de sucesso como
"Stranger Than Paradise" (de Jim Jarmush), "Do
The Right Thing" (de Spike Lee), "Platoon"
(de Oliver Stone) e "Good Morning Vietnam" (de Barry
Levinson). Para o seu lugar foi chamado Bob Bert, e é com
esse line-up que o Sonic Youth grava seu primeiro LP, chamado
"Confusion is Sex", ainda em 1983. A banda continua
com um som bastante alternativo e livre de qualquer rótulo
muito específico, mas nota-se uma influência hardcore nas
músicas, com riffs e bases de guitarras mais pesadas e agressivas.
Inclusive, encontramos no disco um cover de uma das bandas
seminais do punk rock, o Stooges: "I Wanna be Your Dog".
E é assim, agregando influências do punk rock e do underground
em geral, aliadas as experimentações e sonoridades alternativas
que o Sonic Youth começa a delinear seu estilo bastante peculiar
e criativo. As letras escritas por Moore e Gordon falam de
morte, caos urbano, anarquia, relacionamentos, preconceitos,
etc. Ainda em 1983, logo depois de Moore e Gordon se casarem,
a banda excursiona pela Europa e por lá, através do selo alemão
Zensor, lançam o EP "Kill Yr Idols".
Durante 1984, enquanto a banda continuava a tocar em pequenos
shows e apresentações, Moore se esforçava para achar algum
selo com melhor distribuição e maior alcance que aceitasse
trabalhar com o Sonic Youth. A banda estava aos poucos ganhando
notoriedade e nesse ano lança pela Ecstatic Peace um cassete
chamado "Sonic Death: Sonic Youth Live", com músicas
tiradas de shows. Em 1985 o Sonic Youth assina com a Blast
First Records, um selo criado por Paul Smith, um dos donos
da Doublevision Records.
Esta última não havia gostado
muito das demos e dos trabalhos do Sonic Youth e por isso
não os contratou, mas Smith viu potencial em Moore e cia,
e criou a Blast First justamente para lançar os discos do
grupo. O primeiro trabalho pelo novo selo sai ainda em 1985,
é o disco "Bad Moon Rising". A banda continuava
incorporando em seu som influências de hardcore e punk rock,
juntamente com as já características harmonias e arranjos
não convencionais. Ainda assim, a banda não soava totalmente
inacessível e direcionada apenas para um público muito restrito:
as estruturas musicais e melodias eram mais acessíveis e elaboradas.
Essa bem entrosada mistura de tendências fazia do Sonic Youth
uma banda muito promissora, não apenas no circuito alternativo,
mas com potencial de atingir também um público maior e menos
específico.
"Bad Moon Rising" fez bastante sucesso, e a banda
acaba recebendo várias propostas de selos que queriam ter
a banda em seu cast. O Sonic Youth acaba assinando com a SST,
a mesma que bancava algumas bandas já consagradas do cenário
alternativo como o Husker Du, o Minutemen e o Black Flag.
O primeiro disco pela SST é lançado em 1986, e se chama "Evol",
já contando em sua formação com aquele que viria a ser seu
baterista definitivo, Steve Shelley. Nele, as influências
punk mais agressivas foram deixadas um pouco de lado, e a
banda utilizou melodias e arranjos mais convencionais, mas
sem deixar de lado as experimentações e distorções que já
eram a marca registrada do Sonic Youth. O disco tem uma distribuição
bem melhor que os trabalhos anteriores do grupo, e a banda
deixa de ser apenas mais um nome promissor vindo do underground.
Para fechar o ano de 1986, a banda grava a trilha sonora do
filme "Made in USA".
O amadurecimento musical e o reconhecimento por parte da mídia
continua com o disco "Sister", lançado em 1987.
O Sonic Youth vai ganhando aos poucos o rótulo de grande nome
do cenário underground americano, e começa a ter mais exposição
na mídia. A revista Rolling Stone se torna uma das grandes
fãs da banda, publicando reviews bastante positivos dos seus
álbuns. Mas o Sonic Youth não se deixa levar por tudo isso,
e continua com a mesma postura diante do sucesso inesperado.
Sem abandonar as sonoridades alternativas e experimentações
em geral, a banda segue fazendo shows incendiários pelos EUA
e em outros países, e em 1988 lança seu 5º álbum de estúdio,
o aclamado "Daydream Nation". Para muitos é o melhor
disco do Sonic Youth, onde a banda encontrou o equilíbrio
perfeito entre o experimentalismo e a melodia, entre as distorções
de guitarra com as harmonias marcantes. Canções como "Silver
Rocket" e "Teenage Riot" fizeram a banda ser
definitivamente reconhecida como uma das melhores do cenário
alternativo americano. Obviamente não era um sucesso radiofônico
e comercial estrondoso, desses que costumam aparecer frenquentemente
nos EUA (para depois sumir completamente), mas dado o estilo
e a postura da banda, o sucesso era relativamente significativo.
Juntamente com o EP "Master Dick", o disco "Daydream
Nation" foi lançado pela Enigma Records.
Ainda em 1988, o Sonic Youth participa de um projeto paralelo
chamado Ciccone Youth (que conta com o baixista Mike Watt,
ex-Minutemen e Firehouse) e lançam o disco "The Whitey
Album", uma espécie de álbum conceitual-irônico acerca
de toda uma cutura musical, que vai do Pop (covers de Madonna
e Robert Plamer), à musica contemporânea erudita (referenciam
a composição 4:22 de John Cage, através da faixa Silence),
passando pelas influências experimentais do Sonic Youth, que
vem do Krautrock alemão (Neu,
Can).
Em 1990, depois de trocar de selo novamente (a nova casa era
a DGC Records, propriedade de David Geffen), a banda lança
o disco "Goo", que confirmava o bom momento do grupo.
O álbum, que a banda produziu com total liberdade de criação
(garantida pelo próprio David Geffen), também faz bastante
sucesso e teve uma larga distribuição ao redor do mundo, levando
o nome do Sonic Youth à lugares que nunca antes tinham ouvido
falar da banda. Para a divulgação de "Goo", a banda
participa de uma turnê ao lado de Neil Young, que estava divulgando
seu disco último disco chamado "Ragged Glory". Em
outros shows, o Sonic Youth aproveitava para ajudar bandas
iniciantes do underground americano, como por exemplo, os
ainda desconhecidos Mudhoney, Pavement e Nirvana (que seria
contratado por David Geffen no ano seguinte, por indicação
de Moore).
No início de 1992, a banda volta aos estúdios para a gravação
de mais um disco, dessa vez contando com a ajuda de um renomado
produtor, Butch Vig. O resultado é "Dirty", e com
canções como "Sugar Kane" e a politizada "Youth
Against Fascim", o Sonic Youth continua a ser bastante
celebrado e ter seu nome cada vez mais admirado, contando
inclusive com exibição exaustiva de seus clipes pela MTV.
A identidade musical do grupo continuam as mesmas, ou seja,
excelentes canções com melodias criativas em perfeita convivência
com microfonias, distorções e experimentações em geral.
O Sonic Youth volta a a trabalhar com Butch Vig no disco "Experimental
Jet Set, Trash and No Star", lançado em 1994. O álbum
chega a alcançar a 34ª posição na lista de mais vendidos nos
EUA, e a 10ª posição na Inglaterra. Mas o trabalho acaba não
tendo a mesma aceitação de "Daydream Nation" e "Dirty",
e logo despenca das listas citadas, não chegando a fazer o
relativo sucesso comercial dos últimos álbuns. E isso não
poderia ser muito diferente, uma vez que nesse novo trabalho,
a banda abusa nas experimentações e arranjos pouco convencionais,
deixando um pouco de lado a fórmula equilibrada e de bastante
sucesso dos discos anteriores. Ainda em 1994, o grupo resolve
tirar umas férias por causa da gravidez de Gordon e enquanto
esperava o nascimento de seu primeiro filho, Moore grava um
disco solo que é lançado em 1995 pela própria DGC, sob o título
de "Psychic Hearts".
De volta aos palcos em 1995, a banda é a headliner do festival
alternativo Lollapalooza, e logo depois lança mais um disco
de estúdio, "Washing Machine". O disco recebe boas
críticas por parte da imprensa e faz mais sucesso comercial
do que seu antecessor.
Em 1997, o Sonic Youth inaugura em Nova York um selo próprio
chamado Smells Like Records (ou SYR). Através desse selo,
a banda encontra um canal mais apropriado para lançar discos
unicamente experimentais e instrumentais, sem se preocupar
com a aceitação deles por parte do público e da mídia, coisa
que eles não podiam fazer na Geffen ou em qualquer outro selo
do mundo, por motivos óbvios. Ainda em 1997, a banda começa
a produzir um novo disco para a Geffen, que sai no final do
ano sob o título "A Thousand Leaves". As guitarras
de Moore e Lee e os vocais de Gordon continuam bastante criativos
e espontâneos, e junto a isso a banda volta a criar boas melodias
e arranjos mais acessíveis, fazendo o disco ser um novo sucesso
comercial e consolidando mais ainda o estilo Sonic Youth de
fazer rock alternativo.
Na metade de 1999 o grupo volta
aos estúdios ao lado do produtor Jim O'Rourke para a gravação
de um novo trabalho a ser lançado pela Geffen. Apenas em fevereiro
de 2000 o disco fica pronto, sendo lançado então em maio,
sob o título "NYC Ghosts and Flowers". O disco também
possui o equilíbrio alcançado pela banda em "A Thousand
Leaves", com boas melodias convivendo harmoniosamente
com distorções e experimentações em geral. Vale também destacar
a arte gráfica do encarte, que tem fotos de Nova Yorque tiradas
por Lee Ranaldo, desenhos feitos por Kim Gordon e ilustrações
do poeta beat William S. Burroughs. Parte do público
e crítica consideram o disco um pouco irregular, mas
sem dúvida trata-se de mais uma obra com o selo da
banda.
Com Jim O'Rourke oficialmente integrado a banda, o Sonic Youth
lança em 2002 "Murray Street", que tem sido considerado
a volta do Sonic Youth à sonoridade que consagrou a banda.
O'Rourke, que se tornou o terceiro guitarrista do grupo, e
Thurston Moore admitiram em entrevistas que "Murray Street"
reflete influências de rock mais clássico no som do grupo.
O resultado são melodias mais convencionais em comparação
com as do disco anterior, sem abrir mão do estilo Sonic Youth,
o que conquistou a banda os elogios mais entusiasmados da
crítica desde "Dirty", de 1992. O álbum possui
alguns traços que fazem lembrar da tragédia
ocorrida em Nova York no dia 11 de setembro de 2001, com os
atentados terroristas que derrubaram o World Trade Center.
A banda teve que suspender a gravação do álbum
devido este acontecimento, ocorrido a poucas quadras de seu
estúdio.
Em 2003, o grupo começa
a planejar o lançamento de edições especiais
dos LPs de seus catálogos. O primeiro a ser relançado
é "Dirty", que vem acompanhado de um disco
bônus de 16 faixas.
Em 2004, a banda lança
"Sonic Nurse", que fecha uma trilogia iniciada com
os dois álbuns anteriores. O disco é bem recebido
pelos fãs e pela crítica, funcionando quase
que como uma continuação natural de "Murray
Street". Logo depois a banda entra em turnê, passando
inclusive pelo Brasil (já em 2005), onde participam
do Claro Que É Rock, ao lado de Stooges, Flaming Lips,
NIN e Fantômas. No fim de 2005, é a vez de "Goo"
ganahr uma versão "de luxe".
E os lançamento (e relançamentos)
de discos não param: demonstrando um entusiasmo de
banda iniciante, o Sonic Youth tão logo finaliza a
turnê de divulgação de seu último
álbum, já retoma os trabalhos em seu estúdio
para o lançamento de um novo disco. Não contando
mais com Jim O'Rourke, que decidiu se concentrar em outras
atividades particulares, o veterano grupo nova-iorquino lança
em junho de 2006 "Rather Ripped", seu 14º LP.
Dessa vez, a banda solta um álbum de canções
mais diretas e melodiosas, obtendo ótima recepção
por parte da crítica e dos fãs. No mesmo ano,
são lançadas versões especiais para os
álbuns "Psychic Hearts" (solo de Thurstoon),
"The Whitey Album" (do projeto paralelo Ciccone
Youth) e o EP de estréia da banda, de 1982.
Fabricio Boppré
Agradecimento e colaboração: Céllus
atualizado por Alexandre Luzardo e Fabricio Boppré,
ago/2006 |