O
Tool é uma das bandas que levaram às últimas
consequências a fusão da arte com o rock. Embora
suas longas composições não se encaixem
no modelo pop imposto pelo mainstream, o grupo adquiriu admiradores
por todo o mundo. Isto se deve em parte pelos videoclipes
desenvolvidos pelo guitarrista Adam Jones, verdadeiros curta-metragens
de altíssimo nível, também editados e
produzidos pelo resto da banda.
A história do Tool começa
em 1990, quando Maynard James Keenan, aluno da Kendall College
of Art & Design, conheceu Adam Jones, técnico em
efeitos especiais do estúdio de Stan Winston. Eles
descobriram ter outra coisa em comum fora a fascinação
por arte comtemporânea: a música. Maynard e Adam
começaram a compor juntos e chamavam dezenas de músicos
para ensaiar. Eles usavam o estúdio de ensaio pessoal
de Danny Carey, vizinho de Maynard e amigo de Adam. Danny
foi apresentado a Adam por Tom Morello (guitarrista do Rage
Against The Machine), com quem Adam havia tocado baixo numa
banda chamada Electric Sheep. Por indicação
de Morello, Danny Carey se ofereceu para tocar bateria com
Maynard e Adam, pois ao mesmo tempo sentia pena dos dois por
não acharem ninguém para tocar (as pessoas que
eles chamavam nunca retornavam ou então sequer apareciam).
No mesma época, Paul
D'Amour tinha se mudado para Los Angeles para trabalhar no
meio cinematográfico (área em que Adam Jones
estava trabalhando, realizando efeitos especiais para O Exterminador
do Futuro 2, Jurassic Park e Predador 2). Paul era na verdade
um guitarrista, e já estava desistindo de ser músico
quando conheceu Adam Jones, que o convidou para tocar. Uma
curiosidade é que D'Amour estava sempre de mau-humor,
e a sonoridade das músicas se encaixou perfeitamente
com sua personalidade. Com a banda formada, eles começaram
a ensaiar regularmente na casa de Danny Carey. Depois de quase
se chamarem Toolshed, eles escolheram a alcunha de ser simplesmente
Tool, pelo fato de quererem que sua música fosse uma
"ferramenta" para a compreensão da "Lacrimologia",
a "ciência do choro" como terapia, que consiste
em evoluir explorando sua dor física e emocional.
Após certo tempo, eles
começam a abrir shows para Rollins Band, Rage Against
The Machine e Fishbone. Nessa época, eles gravam demos
de quatro canais das canções "Cold &
Ugly", "Hush", "Part Of Me", "Jerk-Off",
"Crawl Away" e "Sober". De todas, apenas
as quatro primeiras entrariam no EP "Opiate", lançado
em Abril de 1992, pela Silvertone Records, da Virgin. Os membros
do Tool declaram que eles erraram de certa maneira na escolha
das faixas do EP, justamente porque eles pegaram apenas as
composições mais pesadas e curtas, e todos que
o ouviram acharam que se tratava de uma banda de trash metal.
Sendo assim, a banda conseguiu uma certa exposição
e boa vendagem com "Opiate". Eles gravaram um clipe
em VHS para "Hush" (dirigido por Ken Andrews, do
Failure), onde todos da banda aparecem amordaçados
e nus, com uma placa escrita: "Parental Advisory: Explicit
Parts" cobrindo suas partes íntimas. Faz sentido,
desde que a música fala sobre censura. Mesmo assim,
o vídeo não foi lançado de maneira oficial,
pelo fato de que a MTV nunca passaria um clipe com este conteúdo
na época! Mas isso não impede que a faixa "Sweat"
apareça na trilha sonora do filme "Scape From
L.A".
Em Abril de 93, chega às lojas "Undertow".
Ou pelo menos, uma versão "domesticada" do
primero álbum do Tool: algumas lojas trocaram a capa
original (um desenho de uma escultura de Adam Jones, uma espécie
de caixa toráxica vermelha com costelas em forma de
tentáculos) por um código de barras gigante.
A parte interior e traseira do encarte ainda traziam fotos
como uma mulher extremamente obesa nua, sozinha, e uma outra
foto da mesma mulher com um homem nu deitado sobre ela, além
de uma radiografia com um enorme vibrador dentro de uma cavidade
anal. Em edições não censuradas, existem
também fotos de uma vaca lambendo suas genitálias
e um porco empalado por uma série de garfos (esta uma
montagem confirmada). Como a arte gráfica do álbum
sugere, este sim é um album cru e verdadeiro do Tool,
com nuances mais melódicas e densas, com as menores
faixas beirando os cinco minutos. Com o álbum catapultado
pelos vídeos de "Sober" (dirigido por Adam
Jones e Fred Stuhr, ganhou as categorias de "Melhor Artista
Novo" e "Melhor Clipe De Hard Rock/Metal" na
MTV) e "Prison Sex" (este o primeiro clipe totalmente
dirigido por Adam), o Tool conseguiu ser uma das atrações
principais do Lollapalooza '93. "Undertow" traz
também como destaque "Intolerance" (que claramente
faz alusões ao período em que Maynard serviu
o Exército Americano nas linhas "You lie, cheat
and steal" em oposição a "I will not
lie, cheat or steal", princípios adquiridos dos
soldados). A enorme "Bottom" tem participação
especial de Henry Rollins; "Swamp Song" e a faixa-título
fazem alusão a uso de drogas, o tema principal do álbum.
A última faixa, "Disgustipated" é
uma narrativa sarcástica sobre o que seria o apocalipse
que as cenouras enfrentam em todos os dias de colheita, com
o som de machados e marretas marcando o tempo... Bizarro!

A banda, na época de "Undertow":
Paul D'Amour, Maynard James Keenan, Danny Carey e Adam Jones.
Depois de "Undertow",
o Tool mergulha em turnês intermináveis para
promover o disco e as especulações de que eles
se tratam de uma banda satanista aumentam junto com a popularidade
que conquistam a cada apresentação. A banda
não se sente ameaçada por isso, pois o que eles
sempre previam era que as pessoas ficassem perturbadas pela
sua proposta. A letra de "Prison Sex", por exemplo,
pode-se tratar de abusos sexuais que Maynard teria sofrido
na infância, o tornando um ser mórbido e sadomasoquista.
Mas até hoje nada disso foi provado; o que se sabe
é que Maynard foi criado por uma família Batista
opressora, daí sua possível revolta contra religiões
ortodoxas.
O Tool ficou parado um bom
tempo até começarem as gravações
de "Ænima", em 1996. O título é
uma junção das palavras "Anima" (um
termo psicológico de Carl Jung) e "Enema"
(inimigo). Poderia também ser uma homenagem a um livro
recomendado pela banda, chamado "Ægypt".
Durante o processo de composição, Paul D'Amour
anuncia que está saindo da banda. Paul mostrou interesse
em outros estilos de música, e procurava algo mais
experimental (?). O grupo então começa a testar
outros baixistas, entre eles Frank Cavanagh do Filter, Scott
Reeder do Kyuss, e Shepherd Stevenson, do Pigmy Love Circus.
O escolhido foi Justin Chancellor, do Peach, banda que havia
excursionado com o Tool na Europa em 1994. Justin não
aceitou o convite de imediato, porque o Peach tinha terminado
há seis meses e ele estava formando um projeto com
o guitarrista de sua antiga banda, com quem tocava desde os
14 anos de idade. Percebendo que não poderia deixar
a oportunidade para trás, ele entrou para o Tool.
Quando "Ænima" foi lançado, o Tool
logo sofreu uma represália: o clip de "Stinkfist"
(primeiro single do disco) foi rejeitado pela MTV, que alegou
que o título da música era ofensivo. Depois
de represália por parte dos fãs, a emissora
passou a exibir o vídeo com o nome de "Track #1",
por ser a primeira faixa de "Ænima".
O fiasco da MTV não
atrapalhou as vendagens de "Ænima". Pelo contrário,
até favoreceu. Todos queriam saber o que havia de tão
absurdo numa canção. Mas de certa forma até
havia: em certa parte da música, (2:45, para ser exato)
Maynard murmura, quase que subliminarmente: "Chupa minha
pica pinto pichu" (em português mesmo)! Aliás,
esta é uma das coisas mais atraentes de "Ænima":
as mensagens subliminares. Em quase todas as faixas Maynard
está sussurrando algo, inteligível ou não.
Fora as mensagens subliminares,
"Ænima" é o disco essencial para quem
quer conhecer o Tool. Faixas memoráveis como "Eulogy",
"Forty-Six & 2", "Hooker With A Penis",
"Pushit" e "Ænema" figuram harmonicamente
com vinhetas inteligentes: "Useful Idiot", "Message
To Harry Manback", "Intermission" e "Die
Eier Von Satan" (não tem nada a ver com nazismo,
aquele "discurso" em alemão é apenas
uma receita de um tipo de cookie!). O trabalho gráfico
da capa de "Ænima" também é
excepcional, com holografias estranhas e soturnas, tanto que
o grupo foi nomeado para "Melhor Embalagem de Álbum"
no Grammy de 1996. No mesmo ano, o Tool ainda foi indicado
para melhor vídeo clip e Curta-Metragem por "Stinkfist".
É nesta época
que Maynard começa a se apresentar nos shows totalmente
careca, com o corpo inteiramente pintado ou então vestido
de mulher, adicionando mais estranheza à perfomance
do Tool. Em meio à imensa turnê, a banda lança
o single e o clipe de "Ænema", concorrendo
a prêmios na MTV, que desta vez não censurou
a criatividade do grupo. "Ænema" chega a ganhar
um Grammy de "Melhor Performance de Metal", em 1997.

A banda, e uma de suas apresentações
no Lollapalooza.
Após o estouro dos shows
de promoção de "Ænima", o Tool
resolve dar um tempo. Maynard grava "Know Your Enemy"
com o Rage Against The Machine e faz um dueto num show com
Tori Amos, cantando "Muhammad My Friend". Ele ainda
forma o Shandi's Addiction, com Billy Gould (Faith No More),
Tom Morello e Brad Wilk (guitarrista e baterista do Rage Against
The Machine). para participar do disco-tributo para o KISS
("Kiss My Ass"), gravando a música "Calling
Dr. Love". A Volcano Entertainment, gravadora do Tool,
não gostou nada disso, e logo processou a banda por
ter violado cláusulas do contrato, alegando que o grupo
estaria participando de projetos em outros selos, e assim
procurando novas propostas de contrato. A banda caiu de frente
contra a gravadora, dizendo que o selo estaria negando a eles
uma cláusula que constava no acordo original. A briga
durou mais de um ano, até que no final ambas as partes
resolveram fazer um novo acordo, evitando medidas judiciais.
O Tool renovou o seu contrato, incluindo a gravação
de mais três álbuns.
Passado o stress com sua gravadora,
seus integrantes se envolveram em apresentações/gravações
ocasionais com bandas de amigos: Adam Jones toca em alguns
shows com o Melvins e monta uma banda experimental com King
Buzzo, chamada Noiseland Arcade, fazendo alguns shows em 1998.
Um bom tempo depois, Maynard começa a ter mais contato
com outros músicos, organizando o projeto Tapeworm,
com Trent Reznor e Danny Lohner, ambos do Nine Inch Nails.
Eles chegam a compor sem compromisso, mas não gravam
nada de oficial.
Mais tarde, Maynard restabelece
contato com Billy Howerdel, técnico de som das sessões
de "Ænima". Howerdel mostra suas composições
e Maynard se oferece para participar do projeto que ele estava
montando com a baixista Paz Lenchantin. Está se formando
o A Perfect Circle, a ocupação de Maynard durante
um certo tempo.
Com o Tool paralisado por conta
de problemas contratuais, Maynard pode se dedicar completamente
ao A Perfect Circle. Formado por Maynard, Billy Howerdel,
Troy Van Leeuwen, Paz Lenchantin e Josh Freese, o grupo começa
a tocar em shows beneficientes, e logo vai abrindo a turnê
de 2000 do Nine Inch Nails. Tentando enganar seus fãs,
Maynard passa a usar uma peruca. Mas ele logo é descoberto,
por causa da grande atenção que o A Perfect
Circle acaba despertando com o álbum "Mer De Noms".
Por ter canções mais melódicas e curtas,
o A Perfect Circle se torna mais acessível que o Tool,
encontrando um sucesso imediato e maior do que a banda principal
de Maynard havia conseguido até então.
Quando o A Perfect Circle
deu um tempo, o Tool imediatamente voltou às atividades.
Para acabar com os boatos de que a banda havia acabado, eles
lançam, em 2000, o box "Salival", que se
trata de um DVD com os cinco clipes da banda e um CD com faixas
ao vivo e raridades. Dentre os destaques, a incrível
versão de "No Quarter", do Led Zeppellin,
"You Lied" (cover do finado Peach, de Justin Chancellor),
a faixa escondida "Maynard's Dick" -que só
pelo título, dispensa comentários- e "Pushit",
em uma versão ao vivo mais longa que a original onde
o professor de percussão de Danny Carey, Aloke Dutta,
dá uma canja. A arte gráfica é invejável,
sendo que a embalagem é uma pequena caixa negra com
um livreto (tipo P.U.L.S.E. do Pink Floyd) com fotos de shows
e cenas dos vídeos.

Justin Chancellor, Maynard,
Danny e Adam.
Enquanto "Salival"
vai matando a saudade dos fãs, o Tool vai gravando
um novo álbum de estúdio. Neste meio tempo,
a banda demite o empresário Ted Gardner, que também
ameaça processar a banda, alegando que eles lhe devem
dinheiro. Mas o caso logo é abafado e nenhuma notícia
sobre o ocorrido vaza para a imprensa.
Após seis anos desde o lançamento de "Ænima",
"Lateralus" é lançado. O disco supera
todas as expectativas, encabeçado pelo clipe futurista
de "Schism", que aparece com "Mantra"
como introdução. A banda aparece revigorada,
com Adam Jones mais refinado, mostrando mais técnica
em seus riffs (sem ser virtuoso). A voz de Maynard, adocicada
pelo A Perfect Circle, mostra sua beleza em "Reflection"
e "The Patient"; mas ao mesmo tempo rasga ensadecidamente
como em "The Grudge" e "Ticks And Leeches"
(a qual a banda não costuma tocar regularmente ao vivo,
visto que Maynard força demais sua garganta). Uma obra
prima como "Ænima", mas com algo mais "luminoso",
onde a banda parece ter assimilado e dosado bem algumas influências
da ideologia Hindu. A banda ganha mais um Grammy, desta vez
por "Schism".
O Tool lança ainda os
clipes de "Parabol" e "Parabola", coladas
como na sequência do álbum, resultando num único
vídeo enorme e que dificilmente é transmitido
pela MTV. Mas o Tool realmente não precisa mais da
MTV para ser bem sucedido e chamar a atenção
de novos fãs. Terminada a turnê de "Lateralus",
em 2003, Maynard volta a se reunir com o A Perfect Circle
para trabalhar em dois novos discos, "Thirteenth Step"
e "Emotive", lançados em 2003 e 2004, respectivamente.
Danny Carey se dedica a estudar percussão com seu professor
Aloke Dutta e a gravar com o Pygmy Love Circus, enquanto Adam
segue sua carreira com efeitos especiais e escreve material
novo para o Tool com Justin Chancellor.
Disco novo do Tool, somente
em 2006, quando finalmente Maynard volta a se reunir com seus
companheiros para finalizar "10,000 Days". O sucessor
de "Lateralus" é lançado em maio,
e tem uma recepção um pouco menos calorosa do
que tiveram os álbuns anteriores entre os fãs.
Após o lançamento do disco, a banda embarca
em uma turnê mundial com datas marcadas para EUA, Europa
e Austrália.
Alexandre Lopes
maio/2003
Atualizada por Fabricio Boppré em agosto/2003
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